No dia 6 de junho o Papa Leão XIV anunciou a nomeação do Pe. Nélio Pita, CM, como bispo auxiliar de Braga, cidade portuguesa. A ordenação episcopal vai ser celebrada na Catedral de Braga, no dia 27 de julho de 2015, às 16h.
Desde 2022, D. Nélio Pita esteve envolvido com as tarefas de assistente geral da Congregação da Missão, sob comando do Superior Geral da CM, Pe. Tomaz Mavric, na Cúria Geral, em Roma.
Nélio Pita nasceu no dia 11 de outubro de 1973, no Estreito de Câmara de Lobos, ilha da Madeira; a 15 de setembro de 1994, entrou para a Província Portuguesa da Congregação da Missão e emitiu os votos perpétuos no dia 25 de março de 1999, tendo sido ordenado sacerdote a 29 de julho de 2000, na Sé do Funchal.
D. Nélio Pita tem Licenciatura em Teologia, na Universidade Católica Portuguesa, sede de Lisboa, antes de se formar em Teologia Espiritual na Universidad Pontificia Comillas, em Madrid (2003), e de fazer o mestrado em Psicologia Clínica no Instituto Superior de Psicologia Aplicada, em Lisboa (2010).
Além disso, D. Nélio Pita frequentou o Curso de Especialização em Psicoterapia Psicodinâmica na Sociedade Portuguesa de Psicologia Clínica, em Lisboa (2014-2018) e é membro efetivo da Ordem dos Psicólogos Portugueses e Membro da Sociedade Portuguesa de Psicologia Clínica.
Enquanto religioso vicentino, o novo auxiliar da Arquidiocese de Braga foi diretor do Seminário Maior da Província Portuguesa da Congregação da Missão (2003-2008) e pároco da Paróquia de São Tomás de Aquino, em Lisboa (2008-2020), tendo integrado o Comité de Ética para a Investigação Clínica (2014-2017; 2020-2023) e o Secretariado Internacional de Estudos Vicentinos (2014-2020), um órgão internacional da Congregação da Missão que se dedica ao desenvolvimento de estudos no âmbito da espiritualidade vicentina, com o propósito de aprofundar o carisma do fundador, São Vicente de Paulo. Em 2020, foi eleito superior provincial da Congregação da Missão, em Portugal. Rezemos para que D. Nélio Pita tenha um caminho abençoado como bispo, mantendo-se fiel à missão vicentina de servir os mais necessitados com humildade, simplicidade, zelo apostólico, mansidão e mortificação.
Abaixo, disponibilizamos a entrevista concedida por D. Nélio Pita, na ocasião de sua visita ao Brasil, ao Informativo São Vicente, N. 328.
Um missionário vicentino português empenhado na animação das províncias pelo mundo
Padre Nélio Pereira Pita, que desde 2020 é Assistente Geral da Congregação da Missão, ficou uma temporada como visitante fraterno na PBCM. Nascido na Madeira, em 1973, ele foi eleito por dois mandatos Visitador Provincial da Província Portuguesa da Congregação da Missão. Licenciado em Teologia pela Universidade Católica Portuguesa, em Lisboa; fez licenciatura canônica em Teologia Espiritual na Universidade Pontifícia Comillas, em Madrid; é mestre em Psicologia Clínica pelo Instituto Superior de Psicologia Aplicada, em Lisboa. Foi, durante vários anos, Pároco na Paróquia de São Tomás de Aquino, em Lisboa, Assistente Provincial dos Padres Vicentinos e Diretor dos Estudantes Vicentinos. Pe. Nélio Pita chegou em terras brasileiras no dia 26 de junho, quando visitou a Escola São Vicente de Paulo, em Nova Iguaçu - RJ, foi à Província do Sul da Congregação da Missão, em Curitiba, retornando ao Rio de Janeiro no dia 14 de julho, quando visitou obras da PBCM tendo momentos de partilha e confraternização com os coirmãos até o dia 30 de julho, quando concedeu esta entrevista para a redação do nosso Informativo São Vicente.
Como tem sido a acolhida aqui no Brasil? É a sua primeira visita ao país? Qual a sua percepção das obras vicentinas visitadas? Alguma situação vista o chamou a atenção, em especial?
Sobre o acolhimento aqui no Brasil, foi evidentemente muito fraterna. Senti-me em casa, em família. O fato de partilhar a mesma língua, de expressar-me, portanto, no mesmo idioma, facilita muito a proximidade. Por outro lado, temos um passado comum. Para mim foi edificante escutar as referências explícitas a coirmãos que ainda estão vivos, que deram contributos na construção e animação desta Província. Alguns já morreram e são grandes referências, como, por exemplo, o venerável Viçoso. E, portanto, senti-me verdadeiramente em casa. E se tivesse de destacar alguma coisa seria esse sentido de pertença. É realmente muito bonito pensar que, apesar das diferenças que há entre nós, das distâncias, sentimos que pertencemos à mesma família, graças ao carisma que herdamos de São Vicente de Paulo. Finalmente, ainda sobre as obras, a Província tem várias obras, desde o trabalho com os mais pobres em áreas como Serra do Ramalho (BA), a Escola São Vicente, no Rio, em Nova Iguaçu, o trabalho nas capelanias, hospitais e com as irmãs. Eu trabalho na formação dos leigos, nomeadamente Família Vicentina, portanto é uma Província com vários focos, com várias expressões em termos de obras, e por isso também é muito bonito e verdadeiramente estimulante. Particularmente fiquei muito sensibilizado com a vossa paróquia ou missão, zona missionária em Serra do Ramalho, as comunidades das agrovilas, muito vivas, de gente muito simples e lembrei-me que ali se vive o carisma de São Vicente, a evangelização dos pobres do campo. Que a Província possa continuar fazendo este trabalho e fidelidade ao carisma que recebeu. Por fim, dizer que, considero esta Província bastante madura, bem estruturada, que tem reflexão, com grande patrimônio não apenas material, mas espiritual, uma cultura já enraizada. E isso é muito bonito, acho que a Província do Rio é sinal de esperança para a Igreja do Brasil, mas também para toda a Congregação.
Qual é a importância, em sua opinião, de se comemorar os 400 anos de fundação da Congregação da Missão?
A celebração dos 400 anos tem sempre várias vertentes. Por uma parte, é uma oportunidade para revisitar o nosso carisma, conhecer o pensamento de São Vicente de Paulo, estudar, portanto, as fontes para que elas continuem a inspirar o nosso presente. A celebração não pode ser apenas um acontecimento num dia, mas tem que ser um processo através do qual nós revitalizamos a nossa atitude como vicentinos. Não podemos apenas olhar para o passado, este olhar para o passado é muito importante, mas este olhar para o passado tem que iluminar o nosso presente, tem que, de alguma forma, moldar as nossas realidades. E, portanto, a celebração é muito importante porque também nos projeta no futuro o que é que nós fomos e o que é que nós queremos ser amanhã. Oxalá possamos, de alguma forma, neste tempo da celebração, encontrar, de alguma forma, respostas às questões que vão surgindo nas nossas sociedades. E estas questões são diversas. As questões que a Igreja e a sociedade no Brasil colocam são diferentes da Igreja e da sociedade da cultura na Europa, mas iluminados por este carisma. Podemos encontrar soluções bem concretas para essas questões, a estes problemas. Por isso é muito importante celebrar os 400 anos, não apenas para dar graças pela vida que temos, pela nossa história, mas também para projetar nosso futuro, para encontrar caminhos para o amanhã.
Para você, como tem sido a experiência de atuar no secretariado internacional de estudos vicentinos?
Na terceira questão, a minha estada tem sido muito vantajosa, pois tenho encontrado pessoas maravilhosas, muito competentes, muito apaixonadas pelo carisma. E aprendo muito escutando essas pessoas. Penso que temos um longo caminho para percorrer e a Congregação e a Família Vicentina. Mas de uma forma muito especial a Congregação e os seus membros têm essa responsabilidade de estudar, de conhecer o legado de São Vicente de Paulo para que amanhã outros possam ser herdeiros deste tesouro espiritual. E nesse sentido, o Secretariado Internacional dos Estudos Vicentinos é um comitê que tem como objetivo estimular os coirmãos e também a família vicentina para o conhecimento mais aprofundado desde patrimônio, às vezes é um patrimônio, em alguns casos, pouco conhecido, pouco amado, pouco valorizado, mas é essencial para nossa identidade.
O quê distingue o modo de agir vicentino dos demais carismas católicos?
Diria que o que distingue o modo de agir vicentino é sobretudo um modo de agir que é moldado pelas cinco virtudes que nós todos aprendemos e fomos motivados a assumir como um estilo de vida: a simplicidade, a humildade, a mansidão, a mortificação e o zelo. E é curioso que estas cinco virtudes, de alguma forma, têm moldado o carisma vicentino, têm moldado a forma de ser missionário. Eu escuto muitas vezes, em muitos lugares, não apenas no Brasil, mas também em outros países, as pessoas dizendo que vocês, missionários, são diferentes. Tem uma forma de ser que é diferente de outros carismas e de outros sacerdotes do clero diocesano. E essa diferença eu penso que é sobretudo por causa das virtudes vicentinas. E como sabem, como sabemos, estas virtudes são os traços do rosto de Jesus, da forma de ser de Jesus. Assim como Jesus foi simples, humilde, manso de coração, homem mortificado e homem zeloso, homem Deus zeloso, este nosso Mestre é inspiração para nós, para também nós assumirmos essas virtudes. E quando assumimos verdadeiramente estas virtudes, a nossa forma de ser é, digamos, peculiar. Eu diria ainda que não apenas no estilo de vida, mas também nas opções que nós fazemos. A nossa opção deve ser uma opção fundamentalmente norteada pelo desejo de servir aos mais fragilizados, aqueles que estão nas periferias da sociedade, aqueles que por vezes já ninguém quer saber. E essa opção, se for assumida, diferencia o ser vicentino de outros carismas existentes na Igreja, que são carismas também muito importantes.
Como promover as vocações religiosas em um mundo de extremismo, polarização, desigualdade e extermínio?
Eu não tenho propriamente um segredo, não tenho propriamente uma receita, e penso que não existem segredos nem receitas fixas, únicas, mas tenho uma visão geral. Eu acho que este mundo que você faz referência de extremismos e polarização é um mundo que gera violência. É um mundo que gera divisão, que gera guerra e separação. E a mensagem da Boa Nova é uma mensagem que promove a unidade, a felicidade, a verdadeira felicidade do homem, a vida com sentido, a vida iluminada pela Palavra de Deus, uma vida plena. E quando nós somos capazes de transmitir esta ideia do Evangelho como um manual de vida em plenitude, eu acho que encontramos outras pessoas disponíveis também para trabalhar nesta área. Pessoas que estão dispostas a consagrar a sua vida por esta causa, por uma causa, portanto, da paz, a causa da vida com sentido, a causa da fraternidade numa sociedade que, de alguma forma, é indiferente à desigualdade e ao sofrimento dos nossos irmãos. Eu penso que nós temos que ser mais audazes na proposta que fazemos, não ter medo, de uma forma clara e direta dizer aos nossos jovens que a vida que Jesus propõe é uma vida em abundância, e que ele quer contar com a ajuda de todos nós. Para que essa vida seja viável, possível a todos os irmãos, e para que este mundo seja menos de guerra, de violência, e sim um lugar de paz, de realização para todos e não apenas para alguns.
Missão quais têm sido as suas principais linhas de atuação?
As minhas linhas de ação como Assistente Geral são aquelas que o Padre Tomaž Mavri?, CM, nosso superior-geral, me indicou, porque sou fundamentalmente o seu assistente e sou responsável por acompanhar um conjunto de províncias, nomeadamente as províncias de língua portuguesa, as três do Brasil, Moçambique e a Missão Internacional em Angola. Também acompanho algumas províncias de língua espanhola: as duas de Espanha, São Vicente de Paulo e Saragossa, além de México e Costa Rica. Acompanho ainda a província da Áustria e da Alemanha. Além destas províncias, do trabalho de assistência a estas províncias, de ligação entre a realidade provincial e a Cúria, eu acho que nós fazemos o trabalho de ponte, fundamentalmente um trabalho de ponte. Eu também sou responsável por acompanhar áreas como o CIF, em Paris, as várias iniciativas do CIF. Também estou acompanhando a Comissão Internacional da Pastoral Vocacional, coordenada pelo nosso coirmão Rolando Gutiérrez, CM e a formação do Clero, portanto são essas as minhas linhas de ação e faço com muito gosto. Tem sido uma experiência riquíssima, porque encontro pessoas santas, motivadas, trabalhando em vários cantos do mundo, evidentemente com problemas, porque não vivemos no reino de Deus, mas nesse mundo onde nem tudo é perfeito.
Grandes Projetos tem sido desenvolvidos pela CM e Família Vicentina Internacional: Globalização da Caridade, Mudança de Estruturas, e agora, o Projeto 13 Casas; todos eles com implícitas preocupações e de defesa dos direitos humanos, dos quais consideramos precursor, Vicente de Paulo. Em sua opinião de que maneira devemos atuar para seguirmos seus passos, nesse caminho?
Penso que um dos primeiros passos é precisamente o de atuarmos como família, porque se aparecemos apenas como CM, somos poucos, não temos peso nem na Igreja, nem nas sociedades, somos pouco relevantes. Mas se aparecermos como movimento, como família que engloba diferentes ramos, é já uma força grande, que terá um grande impacto ou um impacto maior na sociedade e na igreja. Isto dá trabalho, significa que os ramos têm que dialogar, trabalhar, consertar estratégias, agir em comum e não cada um para o seu lado. O segundo passo, eu penso que é importante conhecer mais ainda o pensamento e a espiritualidade de São Vicente de Paulo. Para quê? Para nos tornarmos instrumentos dóceis nas mãos de Deus, para cumprirmos a sua vontade que é, em poucas palavras, a construção do seu reino neste mundo. Sem esta ligação a Deus, que a espiritualidade e o carisma vicentino nos convida, sem esta vinculação ao transcendente, corremos o risco de sermos uma ONG, um grupo humanitário. E os grupos humanitários, as ONGs, são instituições muito parecidas, mas nós queremos ser, ou procuramos ser, uma instituição que é instrumento de Deus, neste tempo. Finalmente, recordava um terceiro passo, que o combate à pobreza e os pobres são o nosso lote, o nosso tesouro. Tem sempre estes três níveis que são muito importantes, que nós não podemos esquecer. O nível da assistência, dar assistência, prestar assistência às pessoas mais carenciadas. Uma assistência que pode ser material, mas também espiritual. Uma dimensão da promoção, ajudar a trabalhar para que os jovens ou os pobres sejam formados, estudem, tenham a possibilidade de se promoverem como pessoas, não só nos estudos mas também no trabalho. E uma terceira dimensão, que é a dimensão da denúncia, uma dimensão mais profética, penso que na Família Vicentina falta um pouco mais nessa terceira dimensão, a dimensão da denúncia. É preciso denunciar sem entrar em polêmicas, sem entrar em situações políticas partidárias. Os vicentinos, a Família Vicentina deve ter a coragem de alguma forma de se pronunciar, fazer declarações públicas contra todas as estruturas que são a causa da pobreza e da desigualdade social, que provocam sofrimento, que provocam dor na sociedade.
Sem querer entrar em polêmica, vimos que recentemente o presidente de Portugal pediu perdão pelos Erros da escravidão e propôs reparação pelos danos causados. Papa Francisco também já se desculpou por erros da Igreja no passado. Em sua opinião os Vicentinos devem se desculpar por algo que tenham feito no passado?
Este é um tema, de fato, bastante delicado, o tema do perdão e da reparação das ofensas. Mas, assim, de uma forma muito sucinta, eu penso que, de fato, como católicos, devemos pedir perdão por aquilo que fizemos de errado, e fizemos muitas coisas erradas. Claro que como português e como nação, estou consciente que este país tem uma história marcada também por períodos de ações criminosas. E não devemos ter vergonha nem medo de pedir perdão por elas e inclusive encontrar estratégias para reparar o mal que fizemos a estes povos. Eu penso que isso faz parte do sentido ético, do imperativo ético que devemos assumir. É claro que, como vicentinos, também temos pecados, cometemos erros. Eu precisaria estudar mais a nossa história para focalizar ou identificar alguma situação, mas certamente cometemos bastantes erros em algumas culturas em especial. Lembro-me, por exemplo, que há bem pouco tempo uma congregação religiosa era acusada de ter também vendido escravos, porque tinha escravos. Penso que não foi o caso dos lazaristas ou vicentinos, mas evidentemente que como grupo humano também tivemos pecado e temos pecado e devemos pedir perdão a Deus e aos homens pelos erros cometidos. Tendo dito isto, Parece-me importante também acrescentar um dado que considero importante: Pedir perdão, não significa que eu tenha que viver angustiado com sentimento de culpa, porque, na verdade, muitos de nós, da geração atual, não tem qualquer culpa do que aconteceu a 100, 200, 300 ou 400 anos. Devemos pedir perdão, mas não viver angustiado com a culpa, porque isso não é saudável, pelo contrário, muito doentio.
Somos filhos da CM Portuguesa. Para você, o que a Província Brasileira representou historicamente para a sua Província? E o que ela significa hoje?
Talvez seja importante considerar que o século XXI na Igreja é por excelência um século missionário. Neste século nasceram muitas congregações e a Igreja expande-se pelos vários territórios até então praticamente abandonados ou que não tinham sido evangelizados. E é neste contexto geral de um esforço que a Igreja faz que podemos situar aquilo que é também a missão dos padres que são enviados para as terras do Brasil. O padre Leandro Castro Rebello e o servo de Deus Antônio Viçoso, enviados para o Brasil, para estas terras vastas e desconhecidas, são um esforço, representam um esforço que uma pequena província de um pequeno país faz para corresponder às expectativas que havia de nos tornarmos, de fato, uma congregação missionária. Podemos dizer que o apelo missionário, o apelo a sermos enviados estava muito presente, mas é neste contexto, neste ambiente, que eles são enviados, apesar de serem um grupo pequeno, são estes dois enviados para o Brasil. Isto, este dado histórico, é para nós motivo de alegria, é para nós motivo de ação de graças, mas não pode ficar no passado de facto. Talvez pudéssemos hoje reavivar esta relação entre Portugal e as províncias do Brasil, nomeadamente a província do Rio, sobretudo em áreas como a formação, uma maior cooperação entre a formação e áreas como o trabalho comum. Hoje, por exemplo, em Portugal existe uma grande comunidade imigrante, formada por brasileiros, muitos deles vivem como ovelhas sem pastor, porque não encontraram - dentro da Província do Brasil - alguém que pudesse vir para Portugal e prestar essa ajuda na área pastoral do acompanhamento aos imigrantes brasileiros. Quero com isso dizer que, não basta ficar olhando o passado, é preciso pensar no presente e projetarmos no futuro.
Os primeiros missionários vicentinos no Brasil vieram de Portugal. Foram exímios missionários, formadores e educadores da juventude. Basearam-se no Santuário do Caraça, obra-mater da Província Brasileira da Congregação da Missão, visitada pelo senhor recentemente. Gostaria de ouvir a sua impressão a respeito dessa obra vicentina que esse ano completa 250 anos de fundação e 30 anos de RPPN.
Devo dizer que fiquei bastante impressionado com a grandeza do espaço e a beleza do edifício e também a vida que lá alberga. Para mim é uma honra pensar que, de alguma forma, os meus coirmãos tiveram um contributo importante na formação deste espaço, desta instituição, que hoje é uma instituição de relevância para a Igreja e para a sociedade brasileira. Relevância pelo contributo que deu na formação de tantos homens que hoje e no passado determinaram a história do Brasil, e continuam a determinar. Por isso, é motivo de grande alegria pensar que os meus coirmãos fizeram tanto, apesar de serem tão poucos. Eu estive pouco tempo no Caraça e por isso a minha opinião, a minha impressão não foi devidamente, não é devidamente fundamentada. Ainda assim, eu me atrevi a dizer que há três áreas importantes e este espaço poderia ser, de fato, uma espécie de laboratório Laudato Si. Hoje o tema da ecologia está na ordem do dia e, porque não, associar este espaço, este santuário à temática ambiental. E dentro deste espaço destacava esta vertente, primeiro uma vertente religiosa, especificamente religiosa, associada em especial ao santuário, à devoção, que é preciso cultivar, que é preciso alimentar, disponibilizando pessoas para o serviço religioso, pessoas que sejam apaixonadas, que sejam competentes, que saibam acolher. Não apenas para presidir uma Eucaristia pontualmente, mas também para confessar, dirigir espiritualmente, promover iniciativas como retiros, promover iniciativas como romarias, encontros de jovens, iniciativas associadas à formação. Esta, digamos, é a dimensão, a área mais religiosa. Depois existe uma outra dimensão muito importante, que é a dimensão mais turística, mais virada para o turismo. E penso que aí estão prestando bom serviço, mas imagino que é necessário uma atenção constante, um trabalho grande, aliado com a cooperação de leigos profissionais, para que o espaço presente qualidade para acolher aqueles que nos procuram numa perspectiva meramente turística. Não podemos fechar as portas desta possibilidade, não só porque é uma fonte de receita, mas também, às vezes, através desta presença, desta proximidade podemos fazer a proposta de Deus. Eu penso que não será raro as situações em que um turista estando no Caraça, acaba por se aproximar da igreja, por ter um contato em uma celebração com o padre, e nós não devemos desvalorizar essa dimensão. Finalmente a terceira dimensão, uma dimensão mais científica, que tem a ver com os aspectos ligados o cuidado com a flora, com a fauna, com os animais, portanto com as aves, mítica, aquilo que é figura do lobo, tudo isso faz desse espaço, o Caraça, um lugar verdadeiramente emblemático, motivo de honra e uma grande responsabilidade para a Província.
Um Jubileu comemorado por casas e obras da Congregação da Missão em todo o mundo apresentará um grande desafio de concentração de esforços e organização internacional. Quais são as principais atividades sugeridas pela Cúria Geral e como gostaria que os vicentinos encarassem esse momento histórico singular?
Eu penso que estas atividades podem ser agrupadas em dois eixos. Um eixo interno, de iniciativas com os destinatários que são fundamentalmente os membros da Congregação, como as celebrações de abertura do Jubileu, as reflexões que foram enviadas em cada trimestre para serem objeto de reflexão em comunidades e ciativas a nível geral e local para celebrar estes 400 anos. As iniciativas mais de caráter viradas para fora, não para o âmbito da congregação, são aquelas, por exemplo, em que o Padre Tomaž Mavri? desafia a sermos mais proativos naquilo que é a proposta do nosso carisma, em contextos como as paróquias que estão nas dioceses em que trabalhamos. Talvez haja, da nossa parte, uma certa timidez, uma certa modéstia quando se trata de falar do nosso carisma e propor as virtudes do nosso carisma a outras pessoas. E, portanto, essa é uma das iniciativas que o Padre Tomaž sugere que assumamos. Penso que o ponto alto destas celebrações será em Paris, no final do mês de abril de 2025, com o tríduo que vai evocar os 400 anos, depois o encontro de visitadoras de todo o mundo, e o encontro com os bispos vicentinos, o encontro com os jovens vicentinos e, finalmente, o encontro com os visitadores das províncias europeias. Haverá, portanto, um conjunto considerável de celebrações, quase um mês de celebrações centradas na Casa Mãe. Finalmente, eu acho que estas festas, instrumentações de graças, devem reavivar em nós a paixão, o amor, o entusiasmo por sermos vicentinos. Às vezes podemos viver nossa vocação de forma um pouco desencantada, um pouco morna, um pouco já sem sabor, e esperamos que estas celebrações reavivem em nós o entusiasmo para sermos vicentinos, porque nosso carisma continua sendo muito atual.
Em 24 anos como presbítero qual trabalho realizou que gostaria de destacar ou ver replicado em outras casas e obras da Congregação da Missão? Por quê?
24 anos passam rápido e dou muitas graças a Deus pela experiência tão diversa e muitas vezes inesperada, que fui assumindo ao longo destes vários anos. Em cada área onde trabalhei senti muita alegria, todas elas foram marcadas pelo inesperado e pela novidade. Eu não me limito a cumprir uma guia, não me limito a executar uma tarefa que está pré-definida, eu procuro sempre criar, inventar. Gosto muito desta dimensão da liberdade que me permite, de alguma forma, pôr um cunho pessoal àquilo que eu faço. Trabalhei como formador e não me esqueço das iniciativas que nessa altura tive com os seminaristas. Alguns deles hoje ocupam cargos, serviços importantes. O Padre Pedro, atualmente visitador, foi meu formando. Também trabalhei durante vários anos, 12 anos mais precisamente, numa grande paróquia em Lisboa. Não esperava trabalhar nessa paróquia, porque sou missionário, ou gostaria de ser missionário. Mas foi isso que me pediram os meus superiores, na altura. Na verdade, o trabalho da paróquia foi uma experiência muito gratificante, porque na paróquia nós encontramos todo o tipo de pessoas, pobres e ricos, analfabetos e pessoas muito inteligentes e muito bem preparadas. E nós temos que saber estar em todos os lugares e dar uma atenção muito grande a todas as pessoas. E envolver estes irmãos, independentemente do seu status social, ajudá-los a criar a consciência de pertença a um corpo, serem membros de uma comunidade, foi para mim extremamente rico. Por outro lado, fomentar aquilo que era a presença dos ramos da família Vicentina nesta comunidade paroquial, nomeadamente as Conferências de São Vicente Paulo e a Juventude Mariana Vicentina foram, por exemplo, dois ramos que nós criamos, que não existiam nesta paróquia. Julgo que, num tempo, numa altura em que uma parte da congregação tem trabalhos paroquiais, se soubermos dar uma dinâmica missionária às nossas paróquias, criar uma motivação forte para que os leigos se comprometam, se envolvam, participem ativamente numa lógica sinodal, isso será muito gratificante. E por isso, acho que vale a pena criar um perfil de paróquia verdadeiramente vicentino, uma paróquia que inclua a todos, uma paróquia que está atenta aos mais pobres e promova esses pobres para que sejam protagonistas na animação da paróquia. Talvez seja essa uma das experiências mais ricas, que eu acho que valesse a pena nós considerarmos atender na Congregação.