Artigos
            Informações             Artigos      
Pe. Wander ferreira, CM
Pe. Wander ferreira, CM A grandeza do serviço da caridade “Não há absolutamente nada mais importante para a Igreja que a caridade. Ela é o amor e o mandamento supremo, que se concretiza em obras: se não fosse assim estariam mortas, como nos diz o Apóstolo Paulo.” (Antônio Frederico Ozanam) Em nossa sociedade, de modo geral, a caridade, na cabeça de muitas pessoas, simplesmente se reduz a alguns gestos de ajuda e auxílio aos irmãos e irmãs carentes. E isso acontece quando damos esmolas a pedintes, cestas básicas a quem está passando fome, pagamos conta de água ou de luz para não serem cortadas, doamos material de construção para construir, terminar ou melhorar as simples residências etc. É claro que essas ações fazem parte da caridade, mas não é a caridade propriamente dita, como muitas pessoas pensam. Então, para aprofundarmos este tema da caridade, é importante para nós, em primeiro lugar, buscarmos a sua origem, ou a sua etimologia. A palavra caridade vem da palavra latina “caritas”, que significa amor sobrenatural ou amor incondicional. E para nós cristãos, sobretudo católicos, é uma virtude que é infundida em nós pelo Espírito Santo (Rm 5,5). É relatada no mesmo pé de igualdade do amor. Não só é a primeira das virtudes, mas é de uma ordem diferente, superior (1Cor 13, 1-13). Na ordem do definitivo, as outras virtudes valem unicamente enquanto ajudam no incremento da caridade ou estão informadas por ela, já que esta configura no modo de ser do próprio Deus e nos faz participar de sua própria riqueza e felicidade, de modo semelhante como, por amor a outra pessoa, fazemos nossa a sua riqueza, sua felicidade ou sua dor. São Vicente de Paulo, na Conferência de 1659 sobre a Caridade afirmou: “A caridade é um preceito divino que abrange vários outros. Cada qual sabe que no amor a Deus e ao próximo estão compreendidas a lei e os profetas. Tudo tende a isso. Converge tudo para esse ponto. E tem esse amor tanta força e privilégio que todo aquele que o possui cumpre as leis de Deus, porque todas se referem a esse amor, e esse amor nos leva a fazer tudo o que Deus nos pede: “Quem ama o próximo cumpriu plenamente a lei.” Ora, isso não diz respeito apenas ao amor para com Deus, mas à caridade para com o próximo por amor de Deus. Isso é tão grande que o entendimento humano não pode compreender (Lc 10,25-37). É preciso que nos esclareçam as luzes do alto para nos demonstrar a altura e a profundidade, a largura e a excelência desse amor.” A caridade faz com que não possamos ver alguém sofrer, sem sofrer com ele; não possamos vê-lo chorar, sem chorar também. “É um ato de amor que nos faz entrar nos corações uns nos outros, e sintamos o que sentem os demais, bem diferentes que nada sentem diante da dor dos aflitos, ou do sofrimento dos pobres. Todo ser humano constitui o corpo místico da Igreja. Somos todos membros um dos outros. Jamais se ouviu dizer que um membro, nem mesmo nos animais, sejam insensíveis à dor de outro membro; uma parte do homem seja machucada, ferida ou violentada sem que as outras não sofram. Isso é impossível. Tem todos os nossos membros tanta simpatia e ligação entre si que o mal de um é o mal de outro. Com maioria de razão, os fiéis, sendo membros de um mesmo corpo e membros um dos outros, devem alimentar a compaixão recíproca. Ser cristão de verdade, ver o irmão aflito e não chorar com ele, e não sofrer com ele, é não ter caridade! É ser cristão de aparência. É não ter humildade. É ser pior que os animais” (Coste, XII, P. 275-276). A caridade também nos faz alegrar com os que se alegram. Ela faz com que entremos nos motivos de alegria dessas pessoas. “Nosso Senhor com suas máximas teve a intenção de nos tornar perfeitos em unidade de espírito, unidade de alegria e tristeza. É desejo seu que entremos nos sentimentos um dos outros. O evangelista São João afirma que, São João Batista, falando de si mesmo e de Jesus Cristo, afirma que o amigo do Esposo se enche de alegria ao ouvir sua voz. ‘Esta minha alegria, foi portanto, realizada. É preciso que ele cresça e eu diminua’ ( Jo 3,27-30). Alegremo-nos da mesma forma, ouvindo a voz de nosso próximo que se alegra, pois representa Nosso Senhor para nós. Alegremo-nos pelos bons êxitos que lhe advêm, e porque nos excede na honra e estima do mundo, em talentos, graças e virtudes. Eis como devemos entrar em seus sentimentos de alegria” (Coste, XII, P. 276-277). Uma importante filha da caridade, que são Vicente afirma que é fundamental para vivermos no amor é a humildade. O santo nos diz que ela, vivida no coração da caridade nos possibilita: “Prevenir-nos com os títulos de honra, porque de outro modo, parece que nos evitamos, e queremos bancar pessoas de importância, altaneiros (Soberbos, ambiciosos, buscas de altos interesses) e indiferentes uns para com os outros. Isso tranca o coração. O contrário, porém, o abre e dilata o coração. É a humildade um verdadeiro produto da caridade, que, na ocasião, nos faz cumular o próximo de respeito e honra, e por, esse meio, nos concilia sua afeição. Portanto, se entre nós pusermos em prática o respeito, praticaremos também atos de humildade que, sendo a humildade filha do amor, fomenta a união e a caridade” (Coste, XII, P. 278). Outra filha muito importante da caridade é a justiça. Não é possível ser homens e mulheres que exercem a caridade se não lutarmos pelo cumprimento da justiça no seio da Igreja e no seio da sociedade. É um ato de nobreza. Neste quesito, São Vicente afirma: “Não há caridade que não seja acompanhada de justiça. Por isso, a caridade abre os caminhos da justiça. Deus lhe dará a graça de entender que, socorrendo os indigentes, fazemos justiça e não misericórdia. (Boissinot, P. 31). Dois séculos mais tarde, fiel ao pensamento vicentino, Frederico Ozanam declara com toda propriedade: “A justiça já supõe muito amor; pois é preciso amar muito o ser humano para respeitar seu direito que limita nosso direito e sua liberdade que incomoda a nossa. No entanto a justiça tem limites; a caridade não os tem” (Boissinot, P. 36). Caminhando para o final desta abordagem, e sintetizando vários pensamentos do nosso texto, vamos trazer presente uma pregação de São Vicente aos seus missionários onde ele insiste para os mesmos colocarem em prática sete atos de caridade que, no seu pensar faz a diferença. São eles: “1º Fazer aos outros o bem que razoavelmente queríamos que fizessem a nós; 2º A ninguém contradizer, e considerar tudo bem em Nosso Senhor Jesus Cristo; 3º Suportar-se mutuamente sem murmurações; 4º Chorar com os que choram; 5º Alegrar-se com os que se alegram; 6º Prevenir-se de honras; 7º Testemunhar aos outros e prestar-lhes serviço, cordialmente. Em suma, fazer-se tudo para todos, a fim de a todos ganhar para Jesus Cristo. Tudo isso se compreende quando nada exista contrário aos mandamentos de Deus ou da Igreja. (Coste, XII, P. 279) Ao praticarmos tais atos de caridade, assumimos o lugar de Nosso Senhor, que foi o primeiro a praticá-las. Escolheu o último lugar. Escolhamo-lo igualmente. Pois Ele veio testemunhar seu amor à humanidade. Cumulou-nos de bênçãos. Previnamos assim nosso próximo com testemunhos de nossa afeição, com moderação e cortesia. E assim, praticar todos os outros atos em seu tempo e lugar, contanto que jamais sejam tais atos, diz a regra, contrários a lei de Deus. Além disso, façamos sempre e por toda parte, o bem, conforme as ocasiões que para isso tivermos, coisa que será muito frequente. E quanto mais fizermos isso no espírito de Nosso Senhor, tanto mais agradáveis seremos a seus olhos". (Coste, XII, P. 279-280). Por fim, colocamos aqui uma reflexão muito incômoda para muitas pessoas, mas a fazemos com muita tranquilidade, e sem o desejo de ofender ninguém, mas de nos questionar com relação ao essencial de nossa fé. Infelizmente, nossa Igreja, de modo geral, vive um catolicismo muito privatizado, onde se incentiva muito a salvação pessoal, sem muito compromisso com o próximo e consequentemente, sem a vivência profunda da caridade. Hoje, é considerado bom católico aquele que está nas Missas, participa dos sacramentos, dos atos devoções e dos vários rituais. A pessoa pode ser a mais complicada na sociedade (desonesta, corrupta, mal caráter, dissimulada, hipócrita etc.), mas se contribui com o dízimo “generosamente” e cumpri todos os atos citados acima, é um católico bem visto. Aqui, o objetivo não é fazer julgamento ou juízo de valores, mas é chamar a atenção para o que realmente nos dá a tônica de Cristãos, e também dizer que, o que vai nos salvar de verdade, de acordo com o Evangelho, é a Caridade e o Amor. E isto fica bem claro no texto do Juízo Final, texto este que será lido e refletido na Solenidade de Cristo Rei desde ano de 2023 (Mt 25,31-46). Portanto, quando o Mestre se manifestar na sua glória, não vai nos perguntar: quantas vezes nós fomos ao templo para rezar ou participar dos rituais, quantas vezes contribuímos com o dízimo, quantas vezes jejuamos, quantos terços nós rezamos, quantas novenas nós rezamos ou participamos. Na verdade ele vai nos perguntar: em que tudo isso nos ajudou a viver com profundidade e intensidade a vivencia da caridade e amor. Pois nós já sabemos que os fariseus, no tempo de Jesus, eram os mais piedosos, os mais participantes dos rituais nos templo, os mais fieis no dízimo, os que mais jejuavam, no entanto Jesus os chamava de hipócritas, porque não transformavam estas ações em gestos de caridade e de amor. Que o nosso Pai, especialista na Caridade, São Vicente de Paulo, interceda sempre por nós para sermos féis aos apelos da missão, principalmente na prática da caridade e do amor a todos os irmãos e irmãs.
Ir. Adriano Ferreira Silva, CM
Ir. Adriano Ferreira Silva, CM Quais guerras escolhemos lutar? As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios provam apenas que a vida prossegue e nem todos se libertaram ainda. (Carlos Drummond de Andrade) Por ocasião da benção Urbi et Orbi deste Natal, o Papa Francisco demonstrou toda sua preocupação com os conflitos armados e guerras que assolam a humanidade nos tempos atuais. “O povo, que não quer armas mas pão, que tem dificuldade em acudir às despesas quotidianas, ignora quanto dinheiro público é destinado a armamentos. E, contudo, devia sabê-lo! Fale-se disto, escreva-se sobre isto, para que se conheçam os interesses e os lucros que movem os cordelinhos das guerras”, declarou o Sumo Pontífice. Segundo a Organização das Nações Unidas, em 2023 encontram-se ativos dezenas de conflitos armados em todo o mundo, especialmente na Ásia e na África. Destes conflitos, oito são classificados como guerras. São Vicente se tornou o Grande Santo do Grande Século a partir da sua diligente atuação durante as guerras que dizimaram boa parte do interior da França, no século XVII. Durante a Guerra dos Trinta Anos e também durante as Frondas, o Pe. Vicente atuou como um verdadeiro general cujas tropas compunham um poderoso exército, que marchava empunhando tão somente as armas da fé e da caridade. É certo que Vicente não era um comandante de escritório, atuava na linha de frente junto aos padres, irmãs e voluntários leigos que compunham suas fileiras de bravos soldados. Sua mais importante batalha era minimizar o sofrimento dos pobres mediante às graves consequências dos conflitos. Um grande exemplo disso é que Vicente fez da sua própria casa, São Lázaro, um verdadeiro centro de atendimento aos refugiados de guerra. Isso pode ser confirmado a partir de uma carta que São Vicente escreveu em junho de 1652, a um de seus padres na região da Alsácia-Lorena, quando ele descreve algumas das ajudas prestadas em Paris: “Sopas distribuídas diariamente a quinze ou dezesseis mil pobres; oitocentas ou novecentas moças recolhidas em boas casas e alimentadas; em São Lázaro são hospedados os vigários, coadjutores e outros padres que tiveram de abandonar as paróquias e fugir para Paris; chegam novos padres, todos os dias, e aqui são exercitados nos deveres, que devem saber e praticar. Eis como Deus permite que participemos em tantas boas obras. As pobres Irmãs de Caridade trabalham mais do que nós no serviço corporal dos pobres. Elas distribuem sopas, diariamente, a mais de mil e trezentos pobres, na casa-mãe. Na paróquia de Saint-Denis a oitocentos refugiados, e na paróquia de São Paulo a quinhentos pobres, além de oitenta doentes. Em outros lugares fazem o mesmo. Peço-vos que rezeis por elas e por nós.” No Brasil não há guerra. Mas há conflitos armados e desarmados que exigem nossa atenção como vicentinos. Nossa principal batalha é contra a pobreza. A insegurança alimentar atinge milhões de famílias em todo país, a falta de moradia é outro problema grave, não podemos esquecer da situação precária de boa parte da nossa educação pública. Também precisamos estar atentos aos preconceitos e discriminações de toda ordem, que matam tanto quanto as guerras declaradas, é nosso trabalho atuar contra essas práticas. As perguntas que ficam para nós hoje são: Quem somos nós no exército vicentino hoje? Quais guerras escolhemos lutar? * Texto originalmente publicado no Informativo São Vicente Ed. 325, leia a edição completa aqui.
Pe. Cléber Fábio Teodósio
Pe. Cléber Fábio Teodósio Missão do Japão Ide por todo o mundo, proclamai o Evangelho a toda criatura” (Mc 16,15). Além desse mandado de Jesus, também São Vicente nos orienta: "Não sou daqui, nem dali, mas de qualquer lugar onde Deus aprouver que eu esteja" (SVP, Es, IX, 30). No decorrer de toda minha história vocacional, passagens como essas têm me motivado a testemunhar o Evangelho de Jesus onde Deus me envia. Na segunda metade de janeiro de 2024, tive a alegria de visitar a Missão do Japão, onde junto ao coirmão filipino Pe. Rogélio Cardenas II, CM, pude servir nas paróquias Santa Terezinha, em Iwata, e Nossa Senhora da Imaculada Conceição, em Kakegawa. Encontrar os irmãos brasileiros e de outras nações que fazem parte da Igreja de Cristo em terras nipônicas foi gratificante. A fé do povo, sua entrega e serviço confirmaram minha vocação missionária.    O Japão é o quinto país do mundo com maior presença de imigrantes brasileiros. Conforme dados do Itamaraty, de 2022, a comunidade brasileira ali presente chegava a 207 mil habitantes. As razões para imigrar são diversas: família, trabalho, estudo... E nada melhor que, mesmo em outro país, possa-se celebrar sua fé em vernáculo (Sacrosanctum Concilium 36 § 2). Pe. Rogélio trabalha na Diocese de Yokohama, no Japão, há 15 anos. Atualmente, serve na Província de Shizuoka, onde é responsável pelas duas paróquias. Hamamatsu, pertencente a Shizuoka, é a cidade com maior presença de nipo-brasileiros no país. Ali atuam os Salesianos, de onde provém o único padre que fala português na região, Pe. Ambrósio da Silva, natural de Timor Leste. A missão vicentina fica nas cidades supramencionadas, que são vizinhas de Hamamatsu. “O amor é inventivo até o infinito” (SVP, br, XI, 102). Pe. Rogélio, descobrindo o grande número de brasileiros em sua área paroquial, e percebendo que alguns tinham dificuldade em compreender na íntegra o japonês, resolveu fazer algo para atender-lhes com mais zelo. Por meio do Facebook, entrou em contato comigo e pediu que traduzisse sua homilia, do inglês ao português, e de posse do texto traduzido acompanhado de áudio, na quarta ou quinta-feira, Pe. Rogélio poderia escutar e treinar a pronúncia, para no fim de semana pregar em japonês, inglês e português. O que agradou aos ouvidos dos brasileiros que passaram a frequentar mais as missas do Padre.    Em janeiro de 2024, convidado para participar da Conferência Internacional da FHA, em Manila, Filipinas, vi como oportunidade singular esticar o passo até o Japão, e uma vez autorizado pelo Visitador Provincial, Pe. Vandeir Barbosa, CM, estive na Missão do Japão, onde pude celebrar o Santo Sacrifício com o Povo, reunir-me com o grupo de jovens “Rosas de Tereza”, fazer bênçãos de casas, visitar famílias, atender confissões, confraternizar e encontrar o jovem mariano vicentino Jhonatan Muryllo, de Curitiba, que estava passando uns dias com a sua mãe no país, e foi celebrar seu aniversário na missa especial rezada para os brasileiros da Comunidade de Iwata. Foi uma experiência de Deus, algo que ficará marcado em minha vida e missão. Japão é outro mundo, as diferenças culturais são realmente marcantes, a distância do Brasil é enorme, estava longe, mas pelo carinho, cuidado e alegria do povo me senti acolhido, próximo, em casa. Muito obrigado é pouco, Deus os pague por tamanha generosidade. A vocês minha gratidão e orações.        “A messe é grande, mas os operários são poucos” (Lc 10,2). O tempo passou rápido e já estou de volta, para continuar minha missão na Paróquia Pai Misericordioso, em Belo Horizonte , Minas Gerais, Brasil. Desde aqui, seguirei colaborando, como tenho feito há mais de três anos, com os nossos irmãos do Japão, a partir de agora, com mais propriedade. Pe. Rogélio já contava: “Embora o pequeno esforço que faço pelas comunidades brasileiras seja muito apreciado por elas, ainda acredito que muito mais precisa ser feito. O que faço na minha homilia é nada diante de tudo que as comunidades precisam: missas em português, confissões em sua própria língua e outros sacramentos, sessões de formação, aconselhamento etc. Eu realmente espero que este esforço do Pe. Cleber e meu evolua a uma oportunidade maior de ajudar e fazer missões reais aqui no Japão, especificamente na Diocese de Yokohama. Há anos venho solicitando e buscando maneiras de encorajar um coirmão do Brasil para vir e se juntar a nós na missão do Japão, mas obviamente ainda não aconteceu. Todavia, não perdi as esperanças. Acredito que chegará o dia em que um coirmão de língua portuguesa e espanhola fará parte de nossa missão aqui no Japão”. Oxalá mais jovens se deixem encantar pela missão e possamos fazer crescer a parceria missionária entre a PBCM e as demais províncias no Brasil e no mundo, de modo que, especialmente os pobres, nossos mestres e senhores, recebam a mensagem de salvação de nosso Deus, seja-lhes anunciado que o Reinado de Deus já chegou e que esse Reino é para eles (SVP, br, XII, 82).
Pe. Jean Rolex, CM
Pe. Jean Rolex, CM Os Desafios da Congregação da Missão para um futuro promissor Ao iniciar um novo ano, todos nós, a nível pessoal, geral ou grupal, costumamos traçar novos caminhos e colocar novos desafios para as nossas vidas que vão desde pequenos objetivos até grandes ideais. Também hoje, a humanidade enfrenta desafios urgentes para um futuro melhor, desafios que incluem problemas ecológicos[1] e conversão ecológica global[2], bem como a necessidade de eliminar as causas estruturais responsáveis pelas disfunções da economia mundial e de corrigir modelos de desenvolvimento que parecem incapazes de garantir o respeito pelo ambiente[3]. Precisamos também enfrentar as alterações climáticas, o aquecimento global; o fraco acesso à água potável para todos, a perda de biodiversidade na natureza[4] e o fosso crescente entre as classes sociais, dentre outras situações sociais extremas que exigem atenção. Da mesma forma, no início do ano, a Congregação da Missão, que peregrina no mundo a serviço dos pobres, estabelece objetivos e propostas que a mantém motivada, criativa, entusiasmada e fortalecida. Esta reflexão resume e explica os desafios mais importantes que entendemos que a Congregação deve enfrentar e superar para avançar e melhorar o seu futuro. Recentemente, a Congregação da Missão realizou a sua 43ª Assembleia Geral, sob o tema: “Revitalizando a nossa identidade no início do quinto centenário da Congregação da Missão”. Parece-nos essencial voltar ao Documento Conclusivo da referida Assembleia, pois ele nomeia os grandes desafios que a Congregação pretende superar para avançar para um futuro promissor. O primeiro desafio é “revitalizar a nossa identidade vicentina”, ou seja, dar vida à nossa espiritualidade, ao nosso estilo de vida e aos nossos ministérios. Mas, a revitalização da nossa identidade passa necessariamente pela reconexão com as nossas raízes, com as origens da nossa espiritualidade e carisma [5]. O que significa então nos reconectarmos com nossas raízes? Significa: interessar-se novamente, ler e rezar com as nossas Regras Comuns, as nossas Constituições e Estatutos. Estes são documentos fundamentais na vida de um missionário. Refletem a espiritualidade e o carisma que Vicente de Paulo nos deixou. São livros qualificados para nos inspirar e nos guiar para um futuro promissor. Agora: até que ponto, como Congregação, nos deixamos inspirar e guiar por eles? Reservamos tempo para lê-los? Quanto sabemos sobre eles? Hoje em dia, e por diversas razões, muitos missionários não leem o suficiente, fazendo com que muitas vezes se esqueçam da beleza da nossa espiritualidade, da nossa identidade e da nossa missão. É urgente, portanto, recuperar o gosto pela leitura entre os missionários, especialmente entre os mais jovens. Ninguém ama o que não conhece. Portanto, se quisermos nos apaixonar pelo nosso carisma, temos que conhecer bem as nossas Regras Comuns, as nossas Constituições e Estatutos. Estas respondem ao que a Congregação pensa de si mesma e como quer apresentar-se hoje na Igreja: uma Congregação que busca a perfeição na caridade. Que eles nos guardem e nos conduzam com segurança ao fim desejado! O segundo desafio é a necessidade de redescobrir a beleza da missão e a sua importância na vida da Igreja e da “Pequena Companhia”. Nossa Congregação nasce e vive da missão. Mas, à medida que o nosso mundo se torna cada vez mais secularizado, individualista, permissivo, relativista, materialista, hedonista e consumista, vemos tristemente que a “Pequena Companhia” é consideravelmente atenuada na sua tarefa de evangelizar o mundo. Atualmente, há na nossa Congregação um enfraquecimento da convicção missionária e uma escassez de santidade entre os nossos missionários[6]. Sem darmo-nos conta, estamos sendo absorvidos pelo mundanismo, pelo pessimismo e pela preguiça espiritual[7] que contaminam os missionários. O que fazer sobre esse problema? O Santo Padre nos aconselha: urgente conversão missionária e compromisso com a santidade[8]. A missão continua urgente. O mundo precisa de Cristo evangelizador dos pobres. A missão pode salvar a nossa vocação e a nossa identidade. A missão tem o poder de transformar. Recuperamos, então, entre nós o mesmo amor e desejo de São Vicente pela missão. Um terceiro desafio diante da Congregação é recuperar a beleza da nossa vocação diante de uma cultura muitas vezes controlada pelo que é externo, pelo que é imediato, pelo que é visível, pelo que é rápido, pelo que é superficial, pelo que é provisório. Em que consiste essa beleza da nossa vocação? A beleza da nossa vocação consiste no fato de que a missão de Cristo é a nossa própria missão, o seu carisma é o nosso próprio carisma e a sua espiritualidade é a nossa própria espiritualidade (cf. XI, 383). Uma vocação de tamanha beleza deve ser encorajada, protegida e promovida, especialmente entre os mais jovens. Não há dúvida de que Deus continua chamando. Mas, como Congregação, temos que cultivar as vocações e construir “uma cultura vocacional”. A cultura vocacional é um conceito que está em voga na nossa Congregação. No entanto, o que especificamente fazemos para criá-lo? Que mudança profunda estamos dispostos a fazer para favorecê-lo? O sucesso e o crescimento das vocações dependerão das mudanças profundas que a nossa Congregação estiver disposta a fazer, não apenas mudanças estruturais, mas também mudanças que influenciem a forma como vivemos a nossa fidelidade a Cristo evangelizador dos pobres e a nossa identidade vicentina. Sem a fidelidade da Congregação à sua própria vocação, qualquer esforço ou mudança na pastoral vocacional não daria verdadeiros frutos. Os desafios mencionados são complementares e conhecidos pela maioria dos missionários. Agora, como queremos enfrentá-los? Que papel pode desempenhar o fator tempo nesta revitalização da nossa identidade? Como o fator tempo condiciona a qualidade da nossa espiritualidade, do nosso estilo de vida e da nossa missão? Reservamos um tempo para parar e realmente encontrar Deus e os outros em oração? O que fazemos realmente nos leva a um relacionamento mais profundo com Cristo? Reservamos tempo suficiente para conhecer a vida intercultural da nossa Congregação?  Aceitamos bem outras pessoas que vêm de uma cultura diferente? Será que nos preocupamos o suficiente para tentar reler a história das pessoas que compõem a nossa Congregação? Definitivamente, se quisermos realmente superar os desafios colocados, devemos dedicar tempo a eles e parar para refletir, a partir de Cristo e do carisma vicentino, sobre o que estamos fazendo e como estamos fazendo. É importante também que recordemos aqueles momentos do nosso encontro com a Congregação da Missão e dela conosco. A recordação desses momentos será a fonte da qual obteremos forças para continuar dedicados à missão de Cristo, evangelizador dos pobres. Notas  [1] Paulo VI (1971). Carta Apostólica Octogesima adveniens, em https://www.vatican.va/. [2] João Paulo II (2001). Catequese sobre o compromisso de evitar a catástrofe ecológica, em https://www.vatican.va/. [3] Bento XVI (2007). Discurso ao Corpo Diplomático acreditado junto à Santa Sé, em https://www.vatican.va/. [4] Francisco (2015). Carta Encíclica. Laudato Sì, em https://www.vatican.va/. [5] Tomas Mavric (2022). Reflexão para a Assembleia Geral de 2022, Vicentina, 66 (3a 4), 375-387. [6]Rolando Santos (2022). A Missão Ad Gentes e a Identidade da Congregação da Missão. Vicentina, 66 (3a4), 409-417. [7] Francisco (2013). Exortação Apostólica. Evangelii Gaudium, em https://www.vatican.va. [8] Ibid. * Texto original publicado em cmglobal.org * Versão em português por Padre Eli Chaves dos Santos, CM
Pe. Louis Francescon Costa Ferreira, CM
Pe. Louis Francescon Costa Ferreira, CM Os pobres são o lugar de experiência e encontro com Deus Alguns detalhes me chamam a atenção nesta imagem de São Vicente: 1) Ele está sentado! Na Sagrada Escritura esta é a posição do Mestre. Assim, aquele que ensina é o 'catequista'. Basta ler Mt 5,1, para aprender isso; quando Jesus subiu à montanha e se colocou na posição do Mestre, sentando-se. Ali, ele deu a maior catequese, a qual chamamos 'Bem-aventuranças'; 2) São Vicente acolhe os pequeninos. Na pessoa dos menores, estão todos os pobres com os quais Jesus se identificará no Juízo Final (Mt 25), os que São Vicente nos ensinou a chamar e reconhecer como 'os nossos mestres e senhores'. Eles são a razão do encontro de Jesus com São Vicente, porque reconheceu neles o evangelho vivo, anunciando-lhes a boa-notícia que salva, cura, liberta, integra e promove, como o fez Jesus, na força do Espírito Divino (cf. Lc 4,16-18). Também Jesus nos pediu para que fôssemos como crianças. Por quê? Porque elas dependem dos progenitores que lhes dão cuidado, amor, atenção e carinho; 3) o olhar de São Vicente para a criança que também lhe fita os olhos. Numa de suas conferências, na qual São Vicente pede à Companhia o espírito de compaixão e misericórdia, ele inicia dizendo: "Quando vamos ver os pobres: sem a compaixão e a misericórdia faríamos apenas um trabalho humano, sem nenhuma atitude de fé e orientação do Espírito. A compaixão e a misericórdia nos ajudam a repetir os gestos do próprio Jesus, que também, na experiência com Deus, experimentou o Abbá (papai, paizinho), e fitou os olhos no Pai, encontrando n'Ele a segurança necessária para o anúncio do Reino (cf. MT 5,48; Jo 17)”. Por isso, os seus olhos estão fitos naqueles que o Fundador reconheceu como herança própria da Pequena Companhia, já que os pobres são o lugar de experiência e encontro com Deus; 4) ao fundo, vemos a cruz com a inscrição SV. Toda a espiritualidade vicentina é cristológica. O Fundador nos pede para revestirmos do espírito de Jesus, a fim de que o horizonte de Cristo seja também o nosso: adorador do Pai e evangelizador dos pobres. São Vicente procura os que foram crucificados pela fome, pelo desânimo, pela sede, pelo desabrigo e tantos outros desafios que pedem do cristão uma resolução criativa até ao infinito, tal qual foi o amor de Deus por nós. Portanto, a inscrição na cruz quer nos lembrar que, como missionários-vicentinos, a nossa vocação e missão passa pelo modelo ideal de Jesus, o crucificado, e pelo exemplo de Vicente de Paulo, servidor de Cristo na pessoa do pobre, o preferido de Deus.
Pe. Vandeir Barbosa de Oliveira, CM
Pe. Vandeir Barbosa de Oliveira, CM Natal: do coração de Deus para o seu coração O tempo do natal é para celebrar o que há de melhor na humanidade, porque foi no natal que o próprio Deus nos doou o seu Filho feito homem. Ao nos doar, Deus nos deu tudo o que possuía. Por isso, o Natal é a celebração da vinda do Filho de Deus ao nosso mundo, do seu nascimento na simplicidade, humildade, sobriedade e inocência de uma criança, o menino Jesus, acolhido por sua mãe, Maria, e por seu pai adotivo, José. É tempo de agradecer por esta generosidade de Deus para com a gente, a ponto de nos doar tudo, seu Filho, Jesus Cristo; é tempo de agradecer a todos e todas que se doaram ao longo do ano com amor, com esperança, com fé e profissionalismo para que muitas pessoas pudessem ter uma vida melhor e mais digna. Obrigado a todos e todas. São Vicente de Paulo descobriu no mistério da encarnação, a imensa generosidade de Jesus que não se agarrou à sua condição divina, mas abaixou-se até a nossa condição humana para nos oferecer a feliz dignidade de filhos e filhas de Deus, em especial aos mais pobres e abandonados. São Vicente acolheu neste sentido o Natal de Jesus Cristo, fazendo-se solidário para com os mais necessitados. Neste mesmo sentido todos que somos Família Vicentina, somos convidados a acolher o mistério do Natal de Cristo como tempo forte para intensificar nossa generosidade, o espírito de partilha, doação de atenção, de tempo de escuta, doação através da amizade, tempo de compartilhar com os mais necessitados o que somos e temos. Também é um tempo especial de recordar que, como Deus acredita e confia no ser humano a ponto de nos doar seu próprio Filho, Jesus Cristo, assim também cada um de nós é convidado a acreditar mais no ser humano, apesar de tantas contradições, violências, guerras, conflitos. É tempo de renovar nossa esperança em cada ser humano; renovar nossa esperança em nossas Comunidades, tornando-as sempre servidoras; tempo de perdoar e abrir novos horizontes nas nossas famílias, Comunidades, grupos; tempo para superar amarras passadas e avançar no caminho de São Vicente de Paulo na certeza de que o Menino Jesus nos aponta seu Futuro, seu Projeto, nos dá segurança, direção e sentido no Novo Ano da graça de Deus. O Natal nasce no coração de Deus e só se torna completo, pleno, quando cada um, cada uma, o acolhe no seu próprio coração. O Natal de Jesus Cristo só estará completo quando alcançar o seu coração, o meu, o de todos e todas, como alcançou o coração de São Vicente. Que São Vicente de Paulo ajude-nos a viver a dimensão profunda do Natal e com Nossa Senhora das Graças, possamos trilhar um novo ano da graça do Senhor confiantes de que Ele caminha conosco e é a razão de ser de nosso trabalho, de nosso serviço e missão, segundo o carisma vicentino. Feliz Natal e um abençoado Ano Novo a todos e todas!  
Pe. Tomaz Mavric, CM
Pe. Tomaz Mavric, CM Carta do Advento 2023 As portas do Advento logo se abrirão e, mais uma vez, um tempo de graça nos será oferecido: um tempo para olharmos para dentro de nós mesmos, para olharmos para o céu, dia e noite, para nos voltarmos para Jesus, que nos inspirará não somente a nos prepararmos para o Natal, mas também para construirmos novos e sólidos alicerces para nossa casa espiritual. Isso não se limita apenas a uma parte do ano, mas implica em uma construção contínua dessa casa, de acordo com o sonho de Jesus para cada um de nós. Ela é direcionada para o nosso objetivo comum: chegar à casa do Pai, conhecer a plenitude do Reino, desfrutar da vida eterna, estar com Jesus e os milhares de santos que nos aguardam no céu para sempre! Conta-se uma história de um rei que amava ler. Em seu castelo, ele tinha várias bibliotecas com centenas de metros de comprimento, repletas de livros novos que comprava constantemente devido ao seu espírito extraordinariamente curioso. Ao longo de sua vida, ele leu milhares de livros. Entretanto, o rei envelheceu e sofria de uma doença incurável. Os médicos lhe disseram: “Você tem apenas seis meses de vida”. Como o rei gostava muito de livros, ordenou que uma equipe de cem pessoas visitasse suas inúmeras bibliotecas para ler mil livros que ele ainda não tinha lido e selecionasse cem livros que ainda esperava poder ler. Após quatro meses, a equipe de leitores apresentou ao rei uma lista de cem livros, escolhidos entre os mil melhores. Entretanto, a saúde do rei havia se agravado nesse período, e ele percebeu que não conseguiria ler cem livros nos dois meses de vida que os médicos lhe concederam. O rei pediu à equipe de leitores que elaborasse uma nova lista, selecionando apenas dez dos cem livros. Dessa vez, os leitores retornaram rapidamente. Depois de um mês, eles haviam selecionado dez livros para levar ao rei, mas sua saúde havia se agravado ainda mais. O rei quase perdeu a visão e sua capacidade de ler estava muito reduzida. Ele percebeu que não seria capaz de ler nem mesmo dez livros no tempo que lhe restava de vida. O rei ainda esperava ler pelo menos um livro antes de morrer. Pediu à equipe de leitores que escolhesse apenas um livro para ler em duas semanas. A equipe fez seu trabalho e, duas semanas depois, retornou ao encontro do rei, que já estava prestes a morrer. O rei havia se tornado totalmente cego, quase surdo, estava fraco e dormia várias horas por dia. No entanto, em alguns momentos, sua mente ainda estava bem atenta. Tinha força suficiente para pedir à equipe que, durante um dia, pudesse resumir o livro em uma palavra. O rei pensou que seria provavelmente o último dia de sua vida. A equipe, que leu esse único livro em conjunto durante toda uma noite, conseguiu chegar a uma única palavra que representava os milhares de livros que tinham lido nos meses anteriores. Na manhã seguinte, a equipe foi ao encontro do rei que estava agonizando e pouco lúcido, e disse a ele: “Meu Senhor, tivemos a graça de ler muitos livros nos últimos meses. Como o senhor pediu, apresentamos uma única palavra que abrange tudo o que foi escrito nestes numerosos livros, e essa palavra é: AMOR”. Se lermos todo o Novo Testamento com o objetivo de encontrar uma única palavra com a qual pudéssemos expressar o cerne de seu significado, sua mensagem e seu conteúdo, a maioria de nós provavelmente diria a palavra “AMOR”. É claro que alguns poderiam encontrar outra palavra que, em algum momento do percurso de suas vidas, teve um significado ainda mais profundo que a palavra “AMOR”. Da minha parte, se hoje eu tivesse que escolher uma palavra que representasse todo o Novo Testamento, essa palavra seria “MISERICÓRDIA”. Desde a época de São Vicente e por sua recomendação, a Congregação da Missão e a Companhia das Filhas da Caridade incluem os exercícios diários de exame particular e geral entre as práticas que dinamizam sua vida espiritual. O Fundador lembra aos Missionários que esses exercícios favorecem o conhecimento de si mesmo e o desejo contínuo de corrigir-se e aperfeiçoar-se com a ajuda da graça de Deus, a fim de eliminar os vícios e cultivar as virtudes (Cf. Regras Comuns X, 9; Estatuto 19). O exame particular é feito normalmente por volta do meio-dia ou antes do almoço. Sob o olhar bondoso de Deus, a pessoa examina brevemente a resolução da oração da manhã para fortalecer o desejo e a determinação de colocá-la em prática, pedindo a graça necessária para alcançá-la. São Vicente, dirigindo-se às Filhas da Caridade, explica o significado desse exercício: “E quanto ao vosso exame antes do jantar, sede-lhe fiéis, minhas Filhas. Sabeis que deve ser feito sobre a resolução tomada na oração da manhã, e agradecer a Deus se, por Sua graça, a tiverdes posto em prática, ou pedir-Lhe perdão se, por negligência, a ela tiverdes faltado” (SV IX, conf. 16 de agosto de 1641, sobre “Explicação do regulamento”, p. 28). À noite, antes de dormir, em um clima de profundo silêncio interior e exterior, cada um deve fazer o exame geral, com o objetivo de revisar sua vida, sobretudo para agradecer ao Senhor pelas graças recebidas, bem como para suplicar o perdão, buscar a conversão, perseverar no que é bom e evitar o que lhe desagrada. Dessa forma, podemos dormir com um bom pensamento e com o coração em Deus. “Guardareis o silêncio desde o exame da noite até o dia seguinte depois da oração, para que esse recolhimento que transparece no exterior favoreça o entretenimento dos vossos corações com Deus; guardai-o principalmente depois da adoração feita a Deus antes de vos deitardes e depois de terdes recebido a sua bênção” (SV IX, conf. 31 de julho de 1634, sobre “Explicação do regulamento”, p. 5). São Vicente de Paulo, “Místico da Caridade”, que encoraja todos nós, membros do Movimento da Família Vicentina, a aproveitarmos cada dia destes maravilhosos instrumentos que são o exame de consciência particular e o exame de consciência geral, na busca da conversão que nos leva à santidade. A expressão “exame de consciência” pode causar uma reação negativa, como algo que não faz mais sentido, ou que prefiro evitar em vez de confrontar os aspectos nos quais Jesus está me chamando para crescer. Se considerarmos que é um momento em que Jesus, o juiz severo, nos julga, que aponta nossas limitações, nossos pecados, nossos fracassos, duas vezes por dia, dia após dia, não é de surpreender que escolhamos o caminho de evitar esse confronto. De fato, é o inverso. Jesus está aguardando este encontro, durante esses dois momentos do dia em que fazemos silêncio, para nos conceder seu amor e sua misericórdia. São momentos em que podemos retornar à nossa leitura diária da Bíblia, especialmente do Novo Testamento, e encontrar uma palavra que resuma toda a mensagem do Novo Testamento, seja ela “AMOR”, “MISERICÓRDIA” ou alguma outra palavra que nos toque profundamente. Nesse sentido, podemos nos alegrar abundantemente com essas ocasiões que reavivam em nosso coração o desejo de mudar, de se converter e de buscar a santidade. Cada congregação, associação de leigos e cada membro que pertence ao Movimento da Família Vicentina pode ter tradições espirituais particulares. Convido as congregações que tiveram a prática espiritual do exame de consciência particular e geral desde suas origens, e cujos membros, por uma razão ou outra, deixaram de lado essa prática em sua jornada espiritual, para que revitalizem ou reintegrem esse dom em suas comunidades e em cada um de seus membros. Agradeço às congregações que permanecem fiéis diariamente a esses dois momentos de graça, por meio do testemunho e do exemplo. Da mesma forma, agradeço o testemunho e o exemplo de cada leigo, pertencente ou não a uma associação, que utiliza esses dois momentos de silêncio com Jesus durante o dia. Para os membros de congregações ou leigos que ainda não o fazem em sua vida de oração, convido-os a incluir esses dois momentos diários de encontro com Jesus. Nós estamos diante de Jesus, que é “AMOR” e “MISERICÓRDIA”. O Advento nos dá a oportunidade de fortalecer os alicerces de nossas vidas, revitalizando esses dois momentos diários de graça, ou de começar a fazer, já neste Advento, o caminho para ver claramente o rosto de Jesus “aqui e agora” e em sua plenitude por, toda a eternidade! *carta enviada aos padres e irmãos da Congregação da Missão em 29/11/2023. 
Pe. Tomaz Mavric, CM
Pe. Tomaz Mavric, CM A Congregação da Missão no Dia Mundial dos Pobres Este ano, o Dia Mundial dos Pobres celebra a sua sétima edição. Com ela, a oportunidade de refletir sobre o compromisso de tantas pessoas no mundo que dedicam o seu tempo e, em muitos casos, a sua vida, para aliviar o sofrimento e a solidão dos pobres. O Papa Francisco exorta-nos na Mensagem para o VII Dia Mundial dos Pobres a não virarmos as costas à realidade, porque “um rio de pobreza corre pelas nossas cidades e vai crescendo até transbordar; “Esse rio parece nos arrastar, tanto que o grito dos nossos irmãos e irmãs que pedem ajuda, apoio e solidariedade, torna-se cada vez mais alto”. Como Congregação da Missão unimo-nos ao desejo do Santo Padre de reavivar “o dom e o compromisso de viver a pobreza e de servir os pobres”, como nos ensinou São Vicente, fundador da nossa Congregação. Em 1617, um acontecimento decisivo marcou a vida de São Vicente de Paulo: o encontro com um doente necessitado de cuidados espirituais. Este acontecimento levou-o a comprometer-se com a evangelização dos mais necessitados. Ele entendeu que a caridade não deveria limitar-se às palavras, mas também atender às necessidades materiais das pessoas marginalizadas. Assim nasceu a primeira Irmandade da Caridade, um primeiro testemunho de como a caridade prática se tornou parte integrante da missão da nossa Congregação. São Vicente não escolheu o caminho fácil, não se limitou a continuar o seu caminho, mas decidiu “não virar as costas aos pobres” como nos convida o lema deste Dia Mundial dos Pobres. Esse gesto deve ter passado despercebido inicialmente pelos seus contemporâneos, no entanto mais de 400 anos depois o eco daquele ato aparentemente inconsequente continua a ressoar fortemente. Anos mais tarde fundaria a Congregação da Missão e desde então, em muitas partes do mundo, milhares de coirmãos trabalharam silenciosamente para servir os mais necessitados. Mas como cada um de nós pode imitar São Vicente na vida cotidiana? Como podemos fazer uma caridade eficaz que alivie o sofrimento dos mais indefesos? Acredito que podemos deixar-nos iluminar pelo lema da Congregação: “Evangelizare pauperibus misit me” (Ele me enviou para evangelizar os pobres). Este é o núcleo do nosso carisma, mas é também um apelo a todos os católicos do mundo. Cada pessoa, na sua situação particular, deve saber que é chamada a evangelizar e a deixar-se evangelizar pelos pobres. Evangelho, missão e pobreza são os três pilares da nossa espiritualidade e o desejo maior que Cristo inscreveu no coração de cada missionário. Os pobres são para cada um de nós um chamado ao encontro com Cristo, que nos espera por trás de cada rosto e de cada história. Seguir em frente, passar ou deixar-se levar pela indiferença nos levará – e de certa forma estamos vendo isso – a uma sociedade menos humana e, portanto, menos cristã. Uma Igreja que dá as costas aos pobres é uma Igreja que dá as costas a Cristo. Inspiremo-nos em São Vicente e também em tantos irmãos na fé que dedicam a vida ao serviço dos mais pobres. Pensem que se São Vicente tivesse decidido ignora-los, não haveria hoje cerca de três mil coirmãos e 507 comunidades em 99 países fazendo um trabalho constante e muitas vezes invisível para aliviar a pobreza neste mundo. E não somos nós que salvamos os mais necessitados, mas são eles que salvam cada um de nós, que nos fazem redescobrir a nossa humanidade original. Sejamos salvos pelos pobres Num mundo onde a pobreza e a necessidade continuam a ser desafios prementes, a partir da Congregação da Missão continuamos a seguir Cristo como evangelizador dos pobres, apoiando o legado de São Vicente de Paulo. Neste caminho rumo ao 400º aniversário (que celebraremos em 2025), a Congregação prepara-se para manter vivo o carisma do nosso fundador e o seu compromisso com os mais necessitados. Vamos dar nome e sobrenome a cada rosto que nos pede ajuda, sabendo que esse pequeno gesto é o que nos salva. Pe. Tomaž Mavri?, CM. – Superior Geral da Congregação da Missão e das Filhas da Caridade. Sobre a Congregação da Missão A Congregação da Missão, fundada por São Vicente de Paulo, em 1625, está empenhada no seguimento de Cristo como evangelizador dos pobres. Conta com mais de 3.100 membros, espalhados por 95 países, trabalhando em prol de uma visão simples: servir os mais necessitados, os que estão à margem da sociedade, os que estão mais afastados das periferias, através da palavra de Deus e da ação. Da mesma forma, os missionários da Congregação da Missão procuram ajudar a todos que estão ao seu alcance. No impacto social nas comunidades vulneráveis, na formação de clérigos e leigos, no cuidado dos peregrinos e das pessoas que buscam a Deus no dia a dia: participa toda a família vicentina – que está presente através de instituições, universidades, fundações e missões afins nesta extensa rede do carisma que experimenta Deus no encontro com os pobres. Mais informações: www.cmglobal.org Sobre o Padre Tomaž Mavric, CM É o vigésimo quinto Superior Geral da Congregação da Missão e da Companhia das Filhas da Caridade. Nasceu em Buenos Aires, Argentina, em 9 de maio de 1959. Seus pais emigraram da Eslovênia, com parentes, fugindo do comunismo em 1945. Após o ensino médio, pediu para ingressar na Congregação da Missão e ingressou na Comunidade da Província de Eslovênia, que então se chamava Província da Iugoslávia, da qual faziam parte coirmãos da Eslovênia, Croácia e Macedônia. Em 1977, frequentou o Seminário Interno de Belgrado, na Sérvia, e cursou filosofia em Ljubljana, capital da Eslovênia, onde também estudou Teologia. Foi ordenado sacerdote em 1983. Trabalhou em Toronto durante 10 anos e depois regressou à Eslovênia, onde trabalhou durante três anos. Em seguida passou 4 anos na cidade de Niutalagil, nos Urais. Em 2004 foi enviado para a casa central, conhecida como “Casa Don de Dios”. Inicialmente destinado à formação, no Seminário Interno e depois eleito, em 2009, Vice Visitador da Vice-Província dos Santos Cirilo e Metódio, até julho de 2016, quando foi eleito na Assembleia Geral de Chicago, como Superior Geral número 25 da Congregação da Missão. * Livre versão para o português de artigo original publicado pela Exaudi Catholic News.
Pe. Michel Araújo Silva, CM
Pe. Michel Araújo Silva, CM Dia dos fiéis defuntos O mês de novembro inicia-se com um profundo significado existencial para os católicos. No primeiro dia, fazemos memória daqueles que nos precederam e hoje contemplam a Glória de Deus (a solene liturgia é celebrada no domingo seguinte). É a Igreja Triunfante. No dia seguinte, celebramos aqueles que, por assim dizer, formam a Igreja Padecente: os fiéis defuntos. Para muitos o dia é marcado por saudade e dor, onde a fé e a esperança se tornam consolação. Nesse sentido, é importante cultivar no coração a seguinte verdade: não importam mais as fragilidades da pessoa que se foi. O Verbo assumiu nossas fragilidades humanas para redenção. Não importa mais o que ficou incompleto na vida daquele que se foi, quando Deus nos colhe, nos abraça no caminho da vida, onde nós estamos é perfeito o caminho. Nestes dias que nós, Igreja Peregrina, unimo-nos à Igreja Triunfante e Padecente, além de rezarmos por todos, somos convidados a refletirmos sobre nossas vidas. "Ensinai-nos ó Senhor a contar os nossos dias para que o nosso coração alcance sabedoria" (Sl 90, 12). É bem certo que a vida é uma caminhada para a morte e que, de certa forma, devemos morrer um pouco todos os dias. Sendo assim, como estamos vivendo? Há algumas expressões que nos parecem um pouco repetitivas, como quando se fala que vivemos numa cultura do hedonismo e do narcisismo, numa sociedade do espetáculo, do individualismo e do egoísmo, num mundanismo espiritual, entre tantas outras coisas que nos ocorrem. Todavia se essas expressões, como tantas outras, soam-nos como repetitivas, talvez seja porque se tornaram muito presentes em nossas vidas e culturas. Basta olhar ao redor, ou para dentro de nós, que encontramos, cada vez mais acentuada, uma preocupação com a estética, com o consumo, com o bem-estar. As pessoas estão cada vez mais autocentradas, preocupadas com coisas superficiais e esquecendo os elementos mais significantes da existência. Estamos vivendo uma epidemia velada. A depressão, a ansiedade e a perda de sentido têm atingido muitas pessoas. Por um lado, estamos cada vez mais expostos nas inúmeras mídias digitais. Por outro lado, preocupamo-nos com as avaliações alheias. A vida parece ter se tornado um desatino, um burburinho. Vai sendo vivida motivada por uma agitação. Agitação da busca. Busca por ter, por prazer, por parecer e aparecer. De modo que o presente não é vivido, mas, ansiosamente só se vive no futuro e (como bem ilustra Mário Quintana) "quando se vê, já se passaram 50 anos"! Que não desperdicemos uma vida toda correndo atrás do vento (Ecl 2,17). Que os vazios existenciais que por vezes, chegam até nós, possam ser preenchidos de uma maneira lúcida, sem perder de vista os ideais e as convicções. Que, deparando-nos com o drama da fragilidade da vida e com a certeza da morte, possamos viver mais conscientes. Que nossa vida se torne, verdadeiramente, dom de Deus para nós e para os que nos cercam.
Diác. Ramon Aurélio, CM
Diác. Ramon Aurélio, CM Primeiro jubileu em honra à Beata Isabel Cristina A festa litúrgica da Beata Isabel Cristina, pela primeira vez, depois de sua beatificação, celebrada no dia 1º de setembro, abre as comemorações do mês vicentino. A data escolhida para celebrar a sua memória, por providência Divina, é o primeiro dia do mês dedicado a São Vicente de Paulo. O dia primeiro de setembro é marcado pelo dia em que ela sofreu o martírio e nasceu para o céu. A Arquidiocese de Mariana preparou-se para celebrar a festa da Beata Isabel Cristina com muito júbilo, alegria, devoção e carisma. Foram três dias de tríduo dedicados a orações contando com a presença dos conselhos particulares da Sociedade São Vicente de Paulo da Região de Barbacena-MG. No dia solene, celebrou-se seis missas, incluindo uma em rito maronita. A beata nasceu no interior de Minas Gerais, no dia 29 de julho de 1962, em Barbacena-MG. Foi morar em Juiz de Fora-MG, onde preparou-se para o vestibular buscando ingressar no curso de medicina. Entretanto, seus planos se interromperam quando foi brutalmente assassinada por um homem que tentou violentá-la. A jovem ofereceu resistência, protegendo seu corpo e sua dignidade culminando em seu brutal assassinato. A mártir vicentina foi vítima de violência contra a mulher. Nas palavras do saudoso Dom Geraldo Lyrio Rocha, por ocasião da beatificação da Virgem e Mártir: “A beatificação da Jovem Isabel Cristina é um sinal profético e vem nos falar da dignidade da mulher, na sacralidade da vida e esta é a voz da Igreja ao feminicídio em nosso país.” Vindo de uma família participativa católica e vicentina, Isabel Cristina é modelo dos valores cristãos, modelo de santidade vicentina e emerge em nossos tempos hodiernos como profecia que ilumina a vida da mulher na Igreja na luta por dignidade e na defesa da castidade. Além disto, sua vida e dedicação às pobres é inspiração para as juventudes no mundo de hoje. Além das missas, no dia dedicado à Beata Vicentina, aconteceu a consagração do altar e a dedicação da Capela da Beata Isabel Cristina pelo Arcebispo Metropolitano de Mariana, Dom Airton José dos Santos. Isabel Cristina é uma beata vicentina e já faz parte do Santoral da Família Vicentina. Ela foi proclamada beata no dia 10 de dezembro de 2022, em Barbacena-MG. Seu martírio foi reconhecido pelo Papa Francisco no ano de 2020. Nesta primeira festa dedicada a Beata Isabel Cristina, houve uma bênção para a juventude e aos universitários. Além disso, houve uma procissão luminosa com a imagem da Beata pelas ruas da cidade de Barbacena, finalizando com a bênção de sua relíquia. Modelo de santidade vicentina, a Beata Isabel Cristina estudou no colégio das Filhas da Caridade e participou da Sociedade de São Vicente de Paulo (SSVP). Testemunho eficaz foi o de seu pai, José Mendes Campos, presidente e membro ativo do Conselho Central de Barbacena. Certamente, o contato com o carisma vicentino a inspirara no serviço e no amor a Jesus Cristo. Roguemos a Deus a interseção da Beata Isabel Cristiana, que quis Deus escolher para junto de si neste dia em que abrimos as festividades do mês vicentino. Que seu testemunho nos interpele a servir, doando nossa vida e juventude, cada vez mais a Jesus Cristo, o Evangelizador dos pobres. Oração pela canonização da Beata Isabel Cristina Deus seja louvado na pessoa da Bem-aventurada Isabel Cristina, virgem e mártir, pelo modo como viveu toda a sua vida, segundo os conselhos evangélicos, e pelo modo como enfrentou a morte, vítima da violência por ódio à fé, defendendo a sua dignidade e o valor da castidade. E se for para a maior glória do Vosso Nome, concedei-me a graça de que necessito (faça-se o pedido) pela intercessão da Beata Isabel Cristina em vista de sua Canonização. PNSJC Amém.
Sem. Carlos Francis Diniz
Sem. Carlos Francis Diniz Testemunho vocacional A voz de Deus ressoa no coração de todos, movendo nossas vidas e transformando nossa história. Cada um à sua maneira e segundo a vontade de Deus.A inquietação e o movimento de busca para responder a esse chamado fazem parte da jornada de cada um de nós.Meu nome é Carlos Francis Diniz, tenho 19 anos e venho da pequena cidade de Itaúna, no centro-oeste do estado de Minas Gerais, Brasil. Desde muito jovem sinto um grande interesse em consumir a mim mesmo e a minha história a serviço de Deus, em Seus altares e por quem mais precisa. Com esse grande desejo, encontrei na minha mãe, Maria Alice do Nascimento, todo o apoio necessário para que isso se tornasse realidade. Comecei minha jornada vocacional servindo em algumas celebrações eucarísticas. Depois de um tempo, servi quase todos os fins de semana em minha comunidade. Não contente em servir na liturgia, ingressei na Sociedade de São Vicente de Paulo (SSVP) a convite de um amigo. Tudo isso aconteceu de forma real e intensa em 2012, moldando assim os próximos passos da minha história. Sentindo-me completo e satisfeito com esses anos de serviço no altar, uma bela frase me veio à mente em minhas reflexões: “Do altar de Deus ao altar dos pobres”. Estas palavras acompanharam minha vida até hoje. À medida que minha vida passava por esses movimentos, nasceu em mim o desejo de me entregar inteiramente à missão. Mas para uma missão dedicada aos mais humildes e em busca de uma verdadeira experiência com os pobres, transmitida a todos nós por Jesus. O tempo passou e conheci duas pessoas muito importantes para a minha vocação, a quem sou extremamente grato: Tainara de Jesús e David Alves (ambos da Comissão de Juventude da região metropolitana a que pertenço). Quando lhes contei o meu desejo de consagração, imediatamente me disseram para iniciar um caminho vocacional com a Congregação da Missão. Entrei em contato com o animador vocacional, que na época era o Padre Denilson Mattias, CM. Participei de encontros vocacionais em Belo Horizonte em 2021 e ingressei no Pré-Seminário I em 2022. Hoje estou no Pré-Seminário II (primeiro ano de filosofia), com a graça de Deus. O que mais me impressiona na Congregação da Missão e nos seus missionários é a sua assistência aos pobres. Através da seriedade da vocação das pessoas consagradas, da sua dedicação aos sacramentos e do cuidado do povo de Deus e, sobretudo, da sua criatividade em projetos sociais que defendem a dignidade dos mais marginalizados da sociedade, vejo o significado da missão missionária vicentina vida. Vejo tudo isso como uma espécie de “plenitude da consagração de um missionário vicentino”, ou seja, algo que traz sentido e beleza ao trabalho missionário. Acredito que o que primeiro me motivou, e ainda me motiva, a me doar dia após dia na Congregação da Missão, é a dedicação de uma mulher que me deu e me dá muito apoio, minha mãe. Foi graças a ela que perseverei na SSVP e adquiri, com o tempo, esse amor pelo Reino de Deus. No início foi difícil, porque eu era muito jovem e nem sempre tinha vontade de participar das reuniões, o que Às vezes eu considerava “chato”. Porém, com muita perseverança, fui formado (e ainda sou) nesta perspectiva de ajudar quem precisa. Disto, concluo que tudo é Graça! Peço a Deus que envie bons missionários à Igreja, especialmente à Congregação da Missão, e que, a partir do encontro pessoal com Cristo, possam configurar-se cada vez mais com Ele. Por fim, peço-lhe que reze uma Ave-Maria por mim e pelos meus curso de companheiros. A oração é força para a vocação. * Texto publicado originalmente na Nuntia Express com o título Testimonio Vocacional: Carlos Francis Diniz (Estudiante de 1º año de filosofía - Provincia de Rio de Janeiro).
Pe. Tomaz Mavric, CM
Pe. Tomaz Mavric, CM Respirar com os dois pulmões Roma, 25 de agosto de 2023 Que a graça e a paz de Jesus estejam sempre conosco. “Chamados a revitalizar a identidade da Congregação da Missão de São Vicente de Paulo”: este título do documento conclusivo da 43ª Assembleia Geral estende um convite a todos nós, membros da referida Congregação. Encontramo-nos num momento crucial na história da Congregação. Com efeito, durante os próximos cinco a dez anos, é muito importante que fortaleçamos os pulmões da “Pequena Companhia”, ou seja, que façamos tudo o que for possível para atrair mais jovens dispostos a optar pela Vocação de Irmão. Ano após ano, o número de Irmãos continua a diminuir e atingiu um nível alarmantemente baixo. Se continuarmos assim, muito em breve perderemos um dos nossos "pulmões”. E isso nos trará consequências quase inimagináveis. Atualmente existem 100 Irmãos em toda a Congregação, mas muitos deles são idosos. Desde o início, São Vicente de Paulo foi muito claro quanto ao seu plano de composição da Sociedade. Na verdade, durante a maior parte de sua história, a Pequena Companhia respirou lindamente, "usando ao máximo todas as dimensões dos pulmões". Todos os Missionários, sacerdotes e irmãos, partilhavam o mesmo carisma e espiritualidade e exerciam o seu ministério segundo o chamado do Espírito. Na situação aqui e agora, nós, como membros da Congregação da Missão, temos que fazer tudo o que estiver ao nosso alcance para continuar respirando com “ambas as partes dos pulmões” ou, como mencionei antes, sofreremos algumas consequências terríveis. “Nossos pulmões”, nossa Congregação, certamente enfraquecerão. Todo o nosso corpo enfraquecerá. Nosso serviço e nossa missão serão mais fracos e menos eficazes. Nossa identidade mudará, mas não da maneira que gostaríamos que mudasse. Por isso, gostaria de propor alguns passos concretos, alguns dos quais já compartilhei no passado, outros são propostos pela primeira vez: 1 - Pastoral da Promoção Vocacional: Este ponto foi mencionado durante a última Assembleia Geral como um dos onze pontos que então salientei e dos quais falei noutras ocasiões. Em primeiro lugar, o nosso programa vocacional deve apresentar o chamado geral como tal, ou seja, o chamado a ser missionário segundo a espiritualidade e o carisma de São Vicente de Paulo. Dito isto, no início devemos também apresentar aos jovens as duas formas de se tornarem Missionários na Congregação da Missão: irmãos missionários ou padres missionários. Em todos os níveis da Congregação, em cada Província, Vice-Província, Região e Missão Internacional, temos Comissões de Pastoral Vocacional. Os coirmãos estão trabalhando arduamente e são muito dedicados nos seus esforços para acompanhar os jovens em seus caminhos de discernimento. Há um grande desafio naquelas Províncias, Vice-Províncias ou Regiões onde, atualmente, não há Irmãos disponíveis que possam participar neste ministério de animação vocacional: encontrar os jovens, falar com eles e apresentar-lhes pessoalmente o papel e oportunidades de serviço para um Irmão. Uma opção está em convidar um Irmão mais novo ou qualquer Irmão de outra província para participar de um retiro de discernimento com jovens ou de algum outro programa vocacional. Isto ofereceria aos jovens a oportunidade de interagir com um dos nossos Irmãos, ser elevados e encorajados por um Irmão, e compreender que na nossa Congregação existem várias opções em relação ao serviço missionário. 2 - Dentro da Congregação, continuamos a usar frases como: “Padres Vicentinos”, “Padres Paúles”, “Padres Lazaristas” etc. Frases que fazem parte do nosso vocabulário. Gostaria de sugerir que nos ajudemos e, portanto, quando ouvirmos um coirmão usar uma frase deste tipo em que os irmãos são excluídos, façamos uma correção fraterna. Por outras palavras, salientamos que, como membros da Congregação da Missão, devemos sempre falar dos irmãos e dos padres como contribuintes iguais para a nossa missão entre os pobres e os marginalizados. 3 - As pessoas a quem servimos ou com quem mantemos contato usarão frequentemente frases semelhantes quando falarem da Congregação ou dos coirmãos. À medida que nos tornamos mais conscientes das palavras, irmãos, também nos encontraremos encorajando outros a serem mais inclusivos ao discutir a composição da Congregação. Podemos sugerir outras alternativas, como por exemplo “Missionários Vicentinos”, “Missionários Lazaristas”, “Missionários Paúles”, “Padres e Irmãos da Congregação da Missão” etc. 4 - Também devemos examinar a forma como descrevemos as nossas casas, a sinalização que aparece nas entradas das nossas comunidades, o papel timbrado oficial das Províncias, Vice-Províncias, Regiões, o papel timbrado que usamos nas nossas casas: se eles não incluem padres e irmãos, então temos que mudá-los. Todos estes vários aspectos, embora muitos deles sejam externos, ajudarão a comunicar uma mensagem clara sobre os membros da Pequena Companhia. Estas mudanças são para o bem comum e pretendem expressar a nossa consciência da urgência de fazer tudo o que estiver ao nosso alcance para apresentar a beleza e o significado profundo do apelo à “Fraternidade” dentro da nossa Congregação. De fato, confiando na Divina Providência, esperamos que o número de Irmãos comece a aumentar e que, quando os jovens iniciarem um processo de discernimento, compreendam que têm duas opções. Que Nossa Senhora da Medalha Milagrosa, São Vicente de Paulo e todos os Santos, Beatos e Servos de Deus da Família Vicentina intercedam por nós. Seu irmão em São Vicente, Tomaž Mavric, CM, Superior Geral
Pe. Allan Júnio Ferreira, CM
Pe. Allan Júnio Ferreira, CM Amigos que se querem bem? Uma das mais famosas exortações de São Vicente aos membros da Pequena Companhia é para viverem à maneira de verdadeiros amigos que se querem bem (cf. Regras Comuns VIII, 2). Essa máxima vicentina é repleta de sentido, pois a vida comunitária, especialmente da Vida Religiosa Consagrada (VRC), por vezes carece de relações fraternas e de vínculos duradouros que poderíamos chamar de amizade. São Vicente escreve para seus coirmãos, como um sincero desabafo: se queiram bem, para quererem bem aos mais pobres. É verdade que o querer bem uns aos outros independe de ser amigos. Posso, por exemplo, desejar e querer o bem de uma pessoa que não faz parte do meu círculo de amizades e que até nutro alguma antipatia. O querer bem ultrapassa as relações de intimidade, pois é mais que isso, é uma questão de humanidade. Não nos esqueçamos que fomos chamados dentro de um contexto relacional e somos enviados para estar com os outros, formando uma comunidade para a missão, ou seja, fomos chamados do meio dos outros para estar com os outros. O querer está na ordem do desejo e em nossa vida desejamos muitas coisas em todo o instante: desejo estar bem comigo mesmo; ter saúde; alcançar uma realização pessoal, ser feliz etc. Percebe-se que o desejo muitas vezes se encontra envolvido em individualismo. É o sujeito que deseja, que quer, que anseia algo. Certamente quando São Vicente pede aos missionários que estabeleçam relações de amizade e que se queiram bem, não está falando apenas de um sentimento de bem-estar consigo mesmo ou de uma relação efêmera, sem vínculos de amor e humanidade. O querer bem é querer que o outro seja plenamente realizado e respeitado em sua dignidade, mesmo que o outro seja repleto de inconsistências e erros. Querer bem é amar e quem ama atrai para si amigos verdadeiros. A amizade é de uma profundidade ainda maior, pois está na ordem da intimidade e da familiaridade. Só é meu amigo aquele a quem eu permito entrar em minha intimidade. A Palavra de Deus nos mostra como é preciosa a amizade. Na sapiência bíblica nos diz: “O amigo ama em todo o momento” (Pr 17, 17); “Amigo fiel é poderosa proteção: quem o encontrou, encontrou um tesouro” (Eclo 6, 14). E no Novo Testamento Jesus tece verdadeiras relações de amizade e intimidade com a família de Betânia, a ponto de chorar a perda de um amigo (cf. Jo 11, 1-44). Além disto, Ele vive a sua relação com seus discípulos e discípulas como verdadeira amizade: “Já não vos chamo servos [...] Eu vos chamo amigos” ( Jo 15, 15). A amizade é um dom e como tal devemos cuidar e cultivar. Os amigos que Deus coloca em nosso caminho, muitas vezes não são nada parecidos conosco. Pense um pouco em suas amizades, quais as semelhanças e quais as diferenças entre vocês? O amigo não é aquele que irá nos preservar das críticas e aprovar as nossas atitudes em todos os momentos. Ao contrário, será aquele que irá discordar veementemente de algum ato inconsequente seu ou alguma postura dúbia que você adotou. O amigo verdadeiro é aquele que permanece ao seu lado mesmo quando nos encontramos à beira do precipício ou, no fundo do poço. “Os bons amigos partilham o bem e o mal que lhes acontecem” (SV, VII, 2654). Costuma-se dizer que se conhece quem é verdadeiro amigo nas horas das dificuldades e esse ditado popular tem toda razão, pois são, sobretudo, nestas horas que vemos que aquela amizade não é utilitarista, mas gratuita, sem esperar recompensas ou agrados. Somos chamados a sermos amigos uns dos outros em nossas comunidades. A alegrarmo-nos com as conquistas e vitórias daqueles que convivem conosco, a celebrar cada passo dado na comunidade, na família, no trabalho e nos círculos sociais em que estamos inseridos. São Vicente de Paulo ainda hoje exorta: sejam amigos que se querem bem, não conhecidos ou colegas que tem que se suportar, no sentido negativo da palavra. A vida comunitária é exigente e é uma das dimensões que mais pesam na VRC. Esforcemo-nos para tecer verdadeiras relações de amizade e mesmo que seja um caminho desafiador não deixemos de trilhá-lo, pois é no esforço da caminhada que chegaremos a uma comunidade saudável, humana e feliz.
Pe. Rogelio Cardenas, CM
Pe. Rogelio Cardenas, CM Missão Vicentina no Japão Olá pessoal, sou o Pe. Rogelio D. Cardenas II, CM, um missionário vicentino filipino que trabalha na Diocese de Yokohama, no Japão. Trabalho aqui há 15 anos. Atualmente estou no sétimo ano como missionário em minha atual designação, na Província de Shizuoka. Sou responsável por duas paróquias, uma na Igreja Católica de Iwata e outra na Igreja Católica de Kakegawa. Nessas duas paróquias, descobri que temos um grande número de brasileiros. Percebi também que, embora essas duas igrejas estejam cheias de brasileiros, durante a missa em português uma vez por mês (por um missionário salesiano de Timor-Leste), muito poucos brasileiros participavam da missa japonesa regular de todos os domingos. Inicialmente, apenas cerca de 5 ou 7 brasileiros se juntavam em uma das paróquias, e menos pessoas ainda, em nossa outra paróquia, apareciam para as missas japonesas. Os que compareciam eram líderes de suas comunidades. Descobri também que muitos brasileiros ainda têm dificuldade em falar e entender a língua Japonesa, o Nihongo. Por algum tempo eu apenas observei essa situação. Eu fazia minha homilia em japonês e inglês e às vezes com uma pequena tradução em filipino. Levei alguns anos para decidir que deveria fazer algo por essas grandes comunidades brasileiras em minhas paróquias. Como pároco deles, pensei em fazer algo para aumentar a participação dos brasileiros até mesmo nas missas em japonês, e também ter uma conexão melhor com eles.Através das redes sociais, no caso o Facebook, conectei-me com o Pe. Cleber Fábio Teodósio, CM, que na época ainda era estudante de teologia. Tornamo-nos amigos instantâneos, além de irmãos na Congregação, é claro. Não me lembro exatamente como surgiu essa parceria, mas acho que pedi um favor a ele, perguntei se poderia traduzir uma parte da minha homilia (não a homilia inteira, apenas as partes significativas) para que eu pudesse usar sua tradução quando fazia minha homilia durante a minha missa em japonês. Contei a ele sobre a situação em minhas duas paróquias, e também lhe disse que talvez uma pequena parte do português que os brasileiros ouvissem já ajudasse a aumentar o número de brasileiros que viriam às Missas. Ele concordou em fazer isso, como uma espécie de “missão estrangeira”. Desde então, até o presente momento, Pe. Fabio tem ajudado com as traduções. Com o passar dos anos, observei que há um aumento de brasileiros nas minhas missas japonesas. O número deles aumentou, embora não seja um número muito grande, mas fico feliz que os brasileiros apreciem o esforço que faço e acho que dizem para outros brasileiros virem, porque faço uma parte da homilia em português. Eles são gratos ao Pe. Fábio por fazer isso por eles também. Eu costumo enviar parte da minha homilia para tradução na quarta ou quinta-feira, e o Pe. Fabio me manda o texto por volta de quinta ou sexta, acompanhado de um áudio, para que eu tenha uma orientação de como pronunciar as palavras corretamente. Já faz anos que somos parceiros nessa empreitada. Quando começamos, o Pe. Cleber Fábio era apenas um estudante de teologia, agora é padre. E a parceria continua. Agradeço a Deus por este dom do Pe. Fábio. E agradeço ao nosso fundador São Vicente de Paulo pela inspiração para este serviço especial às comunidades brasileiras. Embora o pequeno esforço que faço pelas comunidades brasileiras seja muito apreciado por elas, ainda acredito que muito mais precisa ser feito. O que faço na minha homilia é muito pouco. As comunidades brasileiras em minhas paróquias precisam de mais, como missas em português, confissões em sua própria língua e outros sacramentos, sessões de formação, aconselhamento etc. Eu realmente espero que este esforço do Pe. Cleber Fabio e meu evolua a uma oportunidade maior de ajudar a fazer missões reais aqui no Japão, especificamente na Diocese de Yokohama onde trabalho como vicentino filipino. Há anos venho solicitando e buscando maneiras de encorajar um coirmão do Brasil (também dos vicentinos/latino-americanos de língua espanhola, porque também há um grande número de peruanos tanto na minha paróquia quanto na diocese), para vir e se juntar a nós na missão do Japão, mas obviamente ainda não aconteceu. Ainda não perdi as esperanças. Acredito que chegará o dia em que um coirmão de língua portuguesa e espanhola fará parte de nossa missão aqui no Japão. OBS: Livre versão em língua portuguesa, a partir da transcrição de relato em vídeo enviado pelo Pe. Rogelio Cardenas, CM. Idioma original: Inglês.   
Pe. Alexandre Nahass Franco
Pe. Alexandre Nahass Franco Espiritualidade Vicentina e as Bem-Aventuranças “Bem-aventurados os que choram, porque serão consolados” nos introduz à realidade daqueles que sofrem, e dos que choram, mas daqueles que choram pelo Reino. Para alguns, o pranto é expressão de fraqueza. Para outros, é sinal de dor, temor e medo. Para outros, também, é expressão de tristeza e sofrimento. O pranto pode ser causado, também, pela emoção, conforme o motivo e o momento. O pranto é uma expressão do espírito, daquilo que se carrega no coração e na vida. Como diz o salmista: "Minhas lágrimas se converteram em alimento dia e noite, enquanto me repetem, sem cessar: Teu Deus, onde está?" (SI 44,1). Ele chora porque, buscando o seu Deus, sabe que sem Ele não pode viver. Deus é o único que pode satisfazer preencher o coração do ser humano. O que significa chorar pelo Reino? Chorar pelo Reino é sinal de que se descobriu Deus presente na vida, em cada acontecimento, mesmo nos momentos difíceis. Chorar pelo Reino é não ter medo do sacrifício que a conversão exige, porque o Senhor nos mostrou um caminho com dificuldades, um caminho de cruz. Aceitar a cruz é aceitar o caminho de Cristo. Seguir Jesus supõe estar na cruz com Ele. Os primeiros cristãos se comportaram assim, deram testemunho de sua fé com sua própria vida. Os primeiros séculos da Igreja foram cheios de mártires e de testemunhas da fé. Aquele que faz a escolha por Jesus e pelo seu Reino pode experimentar dor e sofrimento. Mas, o que é ainda mais terrível e doloroso, é quando queremos colocar Deus em nossos esquemas e não o conseguimos. É necessário chorar muito para entrar nos esquemas de Deus. Não é fácil descobrir e aceitar a vontade de Deus. Resistimos à vontade de Deus, sobretudo quando esta é difícil e dolorosa. Preferimos seguir o caminho que nós nos traçamos, à nossa maneira, mas a Palavra de Deus chega e desfaz todos os nossos planos, pois é necessário chorar muito para aceitar e continuar o caminho. A experiência de Deus que os Santos fizeram obrigou-os a chorar, a resignar-se diante dos desígnios de Deus e a viver errantes neste mundo. Esta experiência de Deus obrigou-os a viver um despojamento contínuo, uma separação dos seus projetos pessoais. Viver uma contínua renúncia sempre provoca dor e sofrimento. Felizes os que choram por causa de seus males, mas que depois suspiram o bem que só Deus pode lhes dar. Esta Bem-aventurança nos ajuda, também, a contemplar "as lágrimas de Deus", num grito de dor. Quando Jesus viu a multidão, sentiu compaixão deles porque estavam "cansados e abatidos como ovelhas sem pastor" (Mt 9, 36). Abraçar essa Bem-Aventurança é ajudar a experimentar o Evangelho, é consolar os que sofrem e choram, particularmente os mais pobres. Quem são os Bem-aventurados? Bem-aventurados são aqueles que choram, aqueles que assumem seus erros e trabalham para superá-los, saindo de si mesmos. São aqueles que não buscam a culpa por seus sofrimentos e penas. São aqueles que não permanecem inativos, abatidos, mas que se levantam de suas quedas, esforçando-se para superar seus males e viver com esperança. Com São Vicente, poderíamos criar a seguinte Bem-aventurança: Bem-aventurados os que sofrem. Buscando crescer espiritualmente, eles alcançarão a perfeição na caridade! Os que choram pelo Reino são aqueles que se esforçam para descobrir e conseguir o Reino. Eles se mortificam sem cair num masoquismo vazio pelo Reino dos Céus. Descobrir o Reino não é algo fácil, porém, não está fora do nosso alcance, evidentemente que, exige sacrifício, constância e empenho. São Vicente de Paulo, embora tenha vivido numa época onde a mortificação era primordial para conseguir uma vida santa, não faz da mortificação um valor em si mesmo. Para ele, a mortificação é um meio e não um fim na hierarquia espiritual dos valores; ele é realista e conhecedor da vida espiritual, por experiência. Ele sabe que os pobres vivem em constante mortificação, que é a condição de vida habitual dos mais vulneráveis. Já que permanecem na miséria com a incerteza do dia de amanhã. Portanto, as pessoas que têm o futuro seguro também devem buscar viver a mortificação e chorar pelo Reino. Fazemos parte deste grupo. Os pobres não precisam viver prioritariamente a mortificação, esta já é o seu pão cotidiano! Chorar pelo Reino é participar das privações, das angústias e sofrimentos dos pobres. Aproximar-se dos pobres é partilhar com eles de seus sofrimentos, de suas precariedades e de sua realidade sofrida. Chorar pelo Reino é vencer, embora isto exija muito sacrifício, nossas preguiças na oração, na missão e na vida comunitária. É dominar nossa língua e rancores. Em 9 de dezembro de 1657, São Vicente diz: "É mister, bem o vedes, ou fazermos penitência, ou arrastarmo-nos sempre com as mesmas imperfeições, sem nunca nos assemelharmo-nos, em nada, a Nosso Senhor. ” (Coste X p. 716). São Vicente nos exorta a levar uma vida plena, uma vida que tenha sentido, assumindo em nós, a própria vida de Nosso Senhor. Finalmente, chorar pelo Reino é buscar por meio do sacrifício, o que o nosso Santo chamaria de "perfeição da Caridade”. *Artigo originalmente publicado no Informativo São Vicente, Ed. 322.
Pe. Erik de Carvalho Gonçalves, CM
Pe. Erik de Carvalho Gonçalves, CM Mulher, Mãe, Maria, Senhora Nossa Neste mês, no dia 14, é celebrado o dia das mães e a elas orientamos os nossos olhares de gratidão e devotamos muito amor, especialmente pelo sim que deram à Deus, o Senhor da vida. Para este dia, um desafio de fé se impõe a todos nós, especialmente nesse tempo em que se diz ser o da pós-verdade, onde até aquelas que pareciam ser as mais certas foram colocadas sob suspeita. É preciso, iluminados pela Fé, dom de Deus, “celebrar esta festa como um mistério, ou seja, com pretensão de entrar na realidade íntima deste acontecimento, tornando-se um com essa realidade”, como nos inspira Santo Agostinho. Desse modo, faremos uma tentativa de buscarmos o sentido mais profundo desse dia, perguntando-nos qual a mensagem de Deus para nós neste acontecimento. Sim, há uma mensagem daquele que é o Senhor do tempo para nós, uma verdade subjacente e essencial a qualquer discurso ou prática neste dia, que na fugacidade do presente, se revela eterna, perene, porque é de Deus. À primeira vista pode nos causar espanto perguntar sobre a Revelação de Deus em pleno dia das mães, mas importa crer que todo nascimento do ventre de qualquer mulher é uma comunicação da Palavra do Deus da Vida que é verdadeira em si e se revela ao mundo como Esperança de transformação da história humana numa história de salvação, já que se trata da relação do ser humano com seu Deus. Por isso, todo nascimento é um acontecimento de fé, da fé de Deus no ser humano, e como toda comunicação pressupõe interlocução, a esperança é que a resposta da mãe seja simplesmente a de fé em Deus. Assim, quando as mães recebem, pela primeira vez a criança que nasce em seus braços para acarinhá-la e acolhê-la, coração com coração, há uma expressão de fé neste gesto, uma afirmação de crer na verdade de Deus inscrita no seu filho ou filha, e um compromisso de alimentar, proteger e amar por toda a vida aquela vida que o Deus da vida lhe confiou. Aqui chegamos num momento crucial da nossa reflexão, porque na busca da verdadeira profundidade do sentido do dia das mães, do ser mãe, há uma descoberta luminar, de uma mulher que elevou ao mais alto patamar todas as mães e que sempre ensina, sem se vangloriar ou se orgulhar, pois sua virtude essencial foi a humildade, que combinada com a maternidade nos legou o maior dos Dons de Deus, Nosso Senhor Jesus Cristo, nosso Salvador. Bendita entre todas as mulheres (Lc 1,42) Maria é o sinal da esperança de Deus no seu povo, porque acreditou (Lc 1,45) nas promessas que Ele havia feito aos antepassados. Eis aí o atributo nobilíssimo da Bem-Aventurada Virgem Maria, a fé, porque ela acreditou e disse um Sim ao seu Deus e nosso Deus, assumindo todas as consequências, mas sobretudo, confiando na sua contínua presença, “pois o caminhar na presença de Deus é sempre por um caminho claro-escuro dos caminhos impenetráveis de Deus”, como nos diz o Papa Bento XVI. A fé de Maria é sempre confiança e obediência a Deus, ainda que num caminho escuro (Redemptoris Mater, 14). Vejamos se não é o caminho de todas as mães, quando nos lembramos das angústias que nossas mães passaram, preocupadas em serem boas mães, sem saber muito o que isso significa, e preocupadas com os rumos que nós, seus filhos, daríamos a nossas vidas, que tipo de pessoa seríamos. Imaginemos o aperto no coração de Maria quando o Menino Jesus se perde da caravana e fica no templo (Lc 2,41-52). Neste trecho do Evangelho está também um sonho que todas as mães carregam em seu coração: que seus filhos cresçam em sabedoria, idade e graça diante de Deus e das pessoas. Como é bonito reconhecer as histórias das mães de todos os tempos entrelaçadas com a história de Maria, Virgem e Mãe, com alegrias e tristezas, angústias e esperanças. Histórias entrelaçadas que se complementam e se fortalecem entre si, pois em Nossa Senhora vemos a promessa de vitória da humanidade com seu Deus se cumprir, pois, no momento decisivo da história, ela esmaga a cabeça da serpente (Gn 3,15), através do seu Filho, o redentor e vitorioso sobre o mundo (Lc 24,6), sendo confirmada por Deus como a plena de graça. Assim, ainda que na nossa realidade persista a maldição e a servidão, pois a serpente continua a morder o calcanhar dos descendentes da Mulher, todas as mães encontrarão paz na medida em que ensinarem a seus filhos a olharem para o Filho de Maria, levantado na cruz (Jo 3,14), pois este ferimento no calcanhar não leva à morte (Jo 11,4) aqueles que foram marcados com o selo do Espírito. Ouso ainda, apresentar a Virgem Maria como modelo para todas as mães por seu compromisso em transmitir a fé ao seu filho. Cremos que Jesus foi em tudo como nós, exceto no pecado. Olhar para o brilho do ser do homem Jesus de Nazaré é, sem dúvida, reconhecer a vivência das lições que sua mãe e seu pai lhe deram. Sendo uma mulher de fé, em Nossa Senhora repousou o Espírito da verdade, que sempre age no caminho do ser humano que busca o sentido da vida e a Verdade sobre Deus e sobre nós (Jo 14,17). Assim, sempre imagino o dia-a-dia da família de Nazaré como uma catequese cotidiana. Nas situações difíceis, nas alegrias, nas festividades, nas provações, etc., sempre fora ocasião de dar uma lição ao menino que crescia, ajudando-o na tomada de consciência do seu lugar e da sua missão no mundo. O modo de ser e crer do homem Jesus, carrega o modo de ser e crer de Maria, sua mãe. É iluminador pensar na família como um lugar de paz, de fraternidade, de comunhão, como uma Igreja, porque um lugar de vivenciar a fé que se professa. Ainda no horizonte da ousadia, ouso acreditar que Deus escolheu entrar na catequese da família de Nazaré, e com esse movimento, Ele a tornou Sagrada e modelo de comunhão e amor para toda família humana. Termino esta reflexão expressando minha solidariedade com todas as mães que sofrem. Tantos infortúnios em nosso tempo: mães que criam seus filhos sozinhas e precisam se virar para sustentar e educar; mães que veem seus filhos sofrerem violências ou sendo assassinados, independente do motivo; mães que suportam o peso do preconceito do abandono; mães que sofrem violências em suas casas; mães que deixam de se alimentar para dar de comer aos seus filhos. Nossa Senhora se solidariza, entende o sofrimento e intercede por todas as mães. Olhem para ela, se vejam na Bem-Aventurada Virgem Maria. Toda mãe encontrará consolo em Maria se buscar aprender dela a educar seus filhos e os projetarem no caminho do bem, da salvação, sendo fiéis somente à Deus. É primordial que em todos os tempos o ser mãe esteja associado ao exemplo de Maria, mulher firme na fé, porque ouvinte da Palavra do Pai, seguidora do Filho e fecunda no Espírito, porque assídua nas orações (At 1,14). Um feliz e abençoado dia das mães! Pe. Erik de Carvalho Gonçalves, CM.
Pe. Paulo Venuto, CM
Pe. Paulo Venuto, CM 60 anos do Concílio Ecumênico Vaticano II Com poucos meses de Caraça, me intrigava o assunto mais recorrente e comentado: “vai começar o Concílio!”. Concílio ... o que é isso? me perguntava. Por mais que os padres ou alguns colegas mais antigos tentassem explicar, não conseguia entender. Falavam do Papa João XXIII, “aquele velhinho!” De alguma coisa sobre esse “Papa velhinho” me recordava, quando os sinos da Basílica do Seminário de Diamantina dobraram, anunciando a morte de um Papa, em 1958. “É o Pio XII!”, dizia meu pai. Os sinos da mesma Basílica tornaram a soar na eleição do novo Papa. “Vai se chamar João XXIII!”. João como o meu pai. Desses momentos me lembrava, mas o que significava um Concílio... Só com o tempo, fui aprendendo, na prática, à medida que esta “reunião” dos Bispos do mundo inteiro foi acontecendo. Nas leituras do refeitório, as atas de cada sessão eram lidas em alto e bom som. E nós, enquanto trabalhávamos com os talheres, atentos, acompanhávamos, acostumando-nos com os termos, muitas vezes em latim, difíceis para a cabeça de um menino mal entrado no seminário. Era da lavra do Frei Kloppenburg, OFM, nas páginas da REB, que vinham as notícias sobre as discussões e as decisões tomadas nas muitas sessões. Mais tarde, já cursando teologia, em Petrópolis, mais ciente daquilo que representou o Concílio Vaticano II para a Igreja, tive o próprio Frei Boaventura como professor. Agora, revirando aqui e ali, na memória e nos arquivos, podemos falar de alguns traços desse Concílio. O Concílio Vaticano II, iniciado em 11 de outubro de 1962, no pontificado de João XXIII, estendeu-se até 8 de dezembro de 1965, no papado de Paulo VI. Ao convocá-lo, no dia 25 de janeiro de 1959, o Papa João XXIII, referiu-se à necessidade de abrir as janelas da Igreja para que o vento do Espírito Santo pudesse entrar e instaurar “a primavera” na Igreja. Trouxe ao debate um jargão – “aggiornamento”, “atualização”, como a marca desse Concílio, no qual vários temas da Igreja foram abordados pelos padres conciliares e se encontram expressos nos documentos aprovados pelo Concílio: quatro constituições, nove decretos e três declarações. “O Concílio Ecumênico Vaticano II foi uma verdadeira profecia para a vida da Igreja e o continuará sendo, durante muitos anos do terceiro milênio que acaba de iniciar”, disse o Papa Francisco por ocasião dos 60 anos desse evento que trouxe à Igreja um novo tempo. Também, o então Papa Bento XVI, na audiência geral de 10 de outubro de 2012, reconheceu no Concílio “a grande graça de que se beneficiou a Igreja no século XX”. “Quanta riqueza, amados irmãos e irmãs, nas diretrizes que o Concílio Vaticano II nos deu!” foi o dizer do Papa João Paulo II, na Carta Apostólica Novo Millenneo inuente, por ocasião do Grande Jubileu de 2000. Uma das questões que havia sido perdida e foi retomada é a noção de colegialidade. “O que a maioria das pessoas não percebe é que a colegialidade não foi uma tentativa de 'democratizar' a igreja, como seus inimigos gostam de rotulá-la, e, sim, a recuperação de uma tradição antiga segundo a qual o governo normal da igreja era 'sinodal', isto é, realizado por sínodos ou concílios”, disse o jesuíta e historiador John O’Malley, por ocasião dos 50 anos da realização do Vaticano II. O Vaticano II não é um concílio como os outros, é um concílio novo que não se caracteriza por definições cristológicas, que não é influenciado pela controvérsia antiprotestante ou pelo restabelecimento da disciplina eclesiástica. É um concílio que optou pela forma pastoral da doutrina. De fato, representa uma ruptura em relação aos concílios anteriores e ao clima em que o catolicismo evoluía no momento em que se realizou. Com João XXIII e com o Concílio, a Igreja inicia a transformação do dogmatismo, se interessa com os destinatários e com o contexto histórico e cultural em que se movem. Também para  Pedro A. Ribeiro de Oliveira, o Concílio Vaticano II significou a atualização da pastoral católica. “Muitas mudanças, mas quatro essenciais: Liturgia, para atualizar a forma de expressar coletivamente a Fé; Diálogo com o mundo moderno, e não a Igreja regendo a sociedade; Igreja Povo de Deus, superando a concepção de dois estratos: a hierarquia que governa e o laicato que deve seguir suas ordens; e a Palavra de Deus acessível a todo o Povo de Deus. São os quatro pilares da Igreja modelada a partir da crise da cristandade (Igreja aliada ao Estado, moldando a civilização ocidental). Daí outras consequências: ecumenismo, opção pelos pobres (na América Latina e Caribe), valorização da diocese como Igreja particular, pastoral de conjunto (conferências episcopais), leitura popular da Bíblia, Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) em lugar das paróquias, etc.” Em toda a Igreja, nos anos após o Concílio, principalmente, em nossa América Latina, de modo especial, o seu espírito fez brotar um novo “modo de ser Igreja”. A preocupação de fazer eco ao Concílio, as Assembleias dos Bispos Latino-americanos, em Medellin, em 1968, em Puebla, em 1979, deram um rosto novo à Igreja Latino-americana. O próprio Papa Francisco, no exercício de seu ministério na Argentina, se refere a essa nova caminhada eclesial: “O Concílio se tornou o horizonte de nossas crenças, nossa linguagem e nossa práxis que é, e logo se tornou novo ecossistema eclesial e pastoral. Muito simplesmente, o Concílio havia entrado em nossa maneira de ser cristão e de ser Igreja; e, ao longo de minha vida, minhas intuições, preocupações e espiritualidade foram simplesmente geradas pelas sugestões da doutrina do Vaticano II.” Perguntado sobre o que o Concílio realizou, o Papa Bergoglio, respondeu: “O Vaticano II foi uma releitura do Evangelho à luz da cultura contemporânea. Produziu um movimento de renovação que vem simplesmente do próprio Evangelho. Os frutos são enormes.” É importante relembrar a reflexão teológica anterior que desaguou e permeou os documentos do Concílio. A mudança de postura da Igreja frente à modernidade vinha sendo gestada por uma série de movimentos teológicos, nas décadas que antecederam o Concílio. Destacam-se o Movimento Patrístico, o Movimento Litúrgico, o Movimento Bíblico, o Movimento Leigo, o Movimento Teológico. O Movimento Patrístico, fruto do aprofundamento dos escritos dos Santos Padres nos mosteiros da França, Bélgica e Holanda, desencadeou o Movimento Litúrgico propondo um maior conhecimento da liturgia e fazendo com que as celebrações não estivessem distantes das experiências das pessoas. O Movimento Bíblico, com as descobertas arqueológicas e o emprego da hermenêutica no estudo dos textos bíblicos, proporcionou o colocar a Palavra de Deus nas mãos do povo. O Movimento Leigo, fruto de um despertar social manifestado nas preocupações com o crescimento do operariado, no fim do século XIX, cujo protagonista principal foi K. Marx, ao lançar o desafio da práxis, da transformação da realidade social em nítida crítica a uma religião, ópio do povo, fez surgir a Ação Católica (JAC, JEC, JOC e JUC) que conseguiu incorporar os vários universos do laicato nos ambientes dos operários, dos jovens estudantes universitários e da área rural. O Movimento Teológico, mesmo com algumas tentativas anteriores abortadas, conseguiu marcar o contexto teológico anterior ao Concílio principalmente a chamada “Nova Teologia”, surgida na França, cuja plataforma de ação foi lançada por Jean Danielou Todo esse processo que vinha amadurecendo, e tornou presente no espírito do Concílio e na prática posterior da Igreja, a compreensão de “Igreja povo de Deus”, central nos textos conciliares (citada por nada menos do que 184 vezes”). Consequentemente, abriu caminho para a noção de “Igreja-serviço”, “Igreja pobre para os pobres”, um novo modo de ser Igreja. Nela, todos os batizados somos chamados a ser discípulos/as missionários/as e a dar nossa própria contribuição. Também, suscitou o esforço ecumênico, num espírito de diálogo, de respeito à verdade do outro, de reconhecimento da pluralidade;  Consequência de toda essa caminhada de 60 anos, o Papa Francisco retoma e nos ajuda, não só na noção, mas principalmente na consciência e na prática de que somos “Igreja sinodal”. Antes de convocar do Sínodo sobre a Sinodalidade na Igreja, o Papa Francisco manifestou aos membros da Pontifícia Comissão para a América Latina o desejo de que eles pudessem "dialogar sobre esse tema, uma vez que a experiência da Igreja na América Latina foi expressa, após o Concílio Vaticano II, com alguns elementos marcadamente sinodais". Segundo Francisco, a "comunhão" e a "participação" foram as categorias-chave para a compreensão e implementação da III Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano, realizada em Puebla, e a "conversão pastoral" foi um conceito relevante na IV Conferência Geral de Santo Domingo que depois adquiriria ainda mais centralidade na V Conferência Geral de Aparecida.  “Estou convencido de que, de forma avançada, a Igreja na América Latina e no Caribe fez um "percurso caminhando", ou seja, demonstrou que uma interpretação correta dos ensinamentos do Concílio implica reaprender a “caminhar juntos” diante dos desafios ou problemas pastorais e sociais inerentes à mudança de época. Digo "reaprender" porque para caminharmos juntos é sempre importante manter o pensamento incompleto. Tenho alergia a pensamentos já completos e fechados”. Tal processo se fez presente no “Sínodo para Amazônia”, em 2018, como num ensaio para o “Sínodo sobre a Sinodalidade”, cuja preparação está envolvendo, atualmente, toda a Igreja em todos os continentes. * Artigo publicado originalmente no Informativo São Vicente Nº 322.
Ir. Adriano Ferreira Silva, CM
Ir. Adriano Ferreira Silva, CM Salve, Pe. Lauro Palú! Poeta. Fotógrafo. Cientista. Educador. Formador. Missionário. Padre Lauro Palú foi um humanista com H “maiúsculo”. Isso porque sabia de tudo um pouco e muito de muita coisa. Hoje nos reunimos aqui, nesta eucaristia, para rememorar e, por que não, celebrar a sua vida. E quantas memórias ele nos deixa. Tem tanta coisa para falar sobre o Padre Lauro, que não sei direito nem por onde começar. Talvez seja bom dizer um pouco acerca de algumas das coisas que ele fez ao longo de sua vida. Não vou me ater ao rigor das datas e tenho certeza que vou esquecer coisas importantes. Sei que ele trabalhou como formador nos seminários de Mariana e Aparecida. Foi diretor do Colégio São Vicente de Paulo por mais de vinte anos, somadas as duas passagens. Foi Assistente Geral da Congregação da Missão por dois mandatos, quando morou em Roma, por 12 anos. E nos seus últimos anos, foi superior do lugar que mais amou na vida, o Santuário do Caraça. Realizou outros tantos trabalhos na Congregação, pregou incontáveis retiros, escreveu centenas de conferências, publicou inúmeros artigos em jornais e revistas diversos. Enquanto Assistente Geral rodou o mundo e por onde passou deixou sua marca. Gostava de contar histórias pitorescas, por exemplo, sobre como andou de motáxi no trânsito caótico de Hanoi, no Vietnã; ou sobre quando celebrou a eucaristia debaixo de um baobá, em Moçambique. Como gostava de contar histórias, causos e piadas! As noites de vigília a espera do lobo guará no Caraça nunca mais serão as mesmas sem o seu "Guará, Guará, Guarazinho”. O certo é que por trás do semblante sério, o Padre Lauro era uma pessoa de boa prosa, afetuoso e querido por todos. Quem não se lembra dele ao pé da escada do CSVP, dizendo bom dia, bom dia? Na boca do Padre Lauro tudo se transformava em poesia. Era um escritor de rara fineza de estilo. Quem não se lembra dos belíssimos textos que compartilhou conosco, seja na semana pedagógica, ou introduzindo as apresentações dos grupos de teatro e dos corais? Poeta também da imagem, a partir do seu olhar o mais desinteressante dos homens, a formiga mais desconjuntada, o liquém mais esquecido, o lobo mais tímido, tudo se convertia em arte fotográfica. Convivendo com o Padre Lauro, aprendi como era bom ler o mundo por meio daquilo que ele dizia, aprendi como era bom ver o mundo através de suas lentes. Trabalhando com o Padre Lauro, no Colégio São Vicente, aprendi que ser professor é pouco, porque o professor apenas ensina. Que ser educador, também não basta, porque o educador ensina e aprende, mas para por aí. É preciso ir além, temos que nos transformar em formadores. Ensinando, aprendendo e dando o exemplo. Aprendi que nunca devemos impor limites a ninguém, mas devemos estimular o crescimento de todos. Aprendi que nunca devemos falar “dos" outros, mas “com” os outros, a passar do espírito de crítica ao espírito crítico, do espírito de contradição à colaboração; ser imaginativo e criativo para superar os problemas; ver as dificuldades como forças de resistência, cuja direção tentaremos mudar, para que nos ajudem. Ver as coisas com esperança, otimismo, idealismo e fé. Faz uma semana que Padre Lauro cumpriu o seu destino, e junto dele, seu desejo de ser enterrado no Caraça (não nas Catacumbas, onde segundo ele, é escuro, frio e tem escorpião, mas no Cemitério das Sampaias, onde bate sol e ele poderia ouvir o canto dos pássaros). Ainda em 2005, deixou este desejo de descansar no Caraça impresso num belíssimo poema, intitulado Nesta Casa, do qual transcrevo o trecho final, aqui:   "E espero morrer aqui, mesmo que o corpo, coitado, caia num outro lugar.   Tragam para cá meus olhos, deixem aqui minhas mãos, plantem meus pés neste chão.   E sentirão como, aos poucos, irá voltar a bater meu coração, encantado."   Padre Lauro, hoje estamos aqui, agradecidos por sua presença entre nós, ao longo dos seus 83 anos terrestres. Por meio de nós, aqui presentes, por meio dos que te amam e que não puderam vir e pelos que não te conheceram, mas que ainda ouvirão falar de você, você será eterno. Um terno presente sempre entre nós. Salve, Padre Lauro!   * Texto produzido para homenagear Pe. Lauro Palú, CM,  por ocasião da Missa de 7º dia do seu falecimento. ** Fotografia: Ir. Adriano Ferreira, CM
Pe. Vinícius Augusto Ribeiro Teixeira, CM
Pe. Vinícius Augusto Ribeiro Teixeira, CM Querido amigo Pe. Luiz Ontem à noite, meu último ato foi enviar uma mensagem para saber como o senhor tinha passado o dia no hospital. Hoje cedo, a primeira notícia que recebi foi a de sua passagem para o Dia eterno, o que me permitiu tê-lo presente na Eucaristia que acabo de celebrar. Confesso que o sentimento que me invadiu foi o de quem se despede de alguém que lhe é muito próximo e por quem se nutre uma afeição profunda e sincera. E era mais ou menos assim que nos despedíamos cada vez que eu tinha que voltar para a Europa. E isso talvez porque, tendo o senhor escalado as alturas dos 90 anos, já não pudéssemos desconsiderar a possibilidade de que aquela fosse a última vez que nos veríamos e abraçaríamos nos percursos da vida terrena. E assim se deu na tarde do dia 9 de novembro de 2022, quando o senhor me perguntou com voz trêmula: Até quando? E eu lhe respondi, não menos comovido: Até breve. Ao que o senhor reagiu: Se eu ainda estiver por aqui... E eis que, de fato, o senhor não está mais entre nós. Chegou o momento de dizer-lhe adeus, ou melhor, a Deus, Pe. Luiz! E isso, certamente, inclui o até breve de nossa esperança derradeira. Sim, somos pessoas de esperança porque recebemos a luz da fé. E é com ela que nos colocamos diante da vida e também da morte, ou seja, como quem crê no Cristo Ressuscitado, o mesmo que se dirigiu ao Pai com estas palavras: “Aqueles que me deste quero que, onde eu estou, também eles estejam comigo, para que contemplem a glória que me deste” (Jo 17,24). E a razão última dessa promessa de plenitude reside precisamente naquilo que lemos no Ofício de hoje: “Não foi por necessitar de nosso serviço que Deus nos mandou segui-lo, mas para dar-nos a luz e a salvação, pois seguir o Salvador é participar da salvação e seguir a luz é receber a luz. Aos que o seguem e servem, Deus concede a vida e a glória eterna” [Santo Irineu (séc. II)]. É verdade, Pe. Luiz (ou tio Luiz, com o chamávamos no calor da vida comunitária). Conhecemos de perto seus limites. E o senhor também conheceu os nossos. Mas nada se sobrepõe à gratidão por tudo o que vivemos em sua companhia e por tudo o que recebemos de sua solicitude. Gratidão por sua vida tão longeva, por sua entrega generosa ao Senhor, por todo bem realizado ao longo de seus anos, pelo dinamismo e pela criatividade com que abraçou os muitos ministérios que lhe foram confiados, por sua capacidade de criar laços de comunhão, por sua atenção aos amigos, por sua memória prodigiosa, por seu bom humor, etc. Certa vez, escutei que só envelhecem aqueles que se levantam sem projetos e se deitam sem esperanças. Se for realmente assim, o senhor soube conservar como poucos a jovialidade da alma, coroando sua fecunda ancianidade com o diadema da fé, tal como os cedros do Líbano que florescem nos átrios da casa de Deus ou os justos que “mesmo no tempo da velhice dão fruto, cheios de seiva e de folhas verdejantes” (Sl 92,13-14). De minha parte, sinto-me verdadeiramente agraciado e agradecido pela dádiva de nossa amizade, cultivada sobretudo nos 4 anos de nossa convivência mais intensa a serviço da Paróquia São José do Calafate, partilhando esforços, preocupações e responsabilidades. Posso dizer que desfrutei de sua proximidade fraterna, aprendi de sua experiência sacerdotal, recebi de sua cooperação pastoral, enriqueci-me com nossas conversas descontraídas, ri muito ouvindo suas histórias, etc. Livre de saudosismos, o senhor foi um bom companheiro para meus primeiros anos de pároco. Estando já aqui, do outro lado do Oceano, lembrei-me de nosso convívio e colaboração ao ler o que menciona o Papa Francisco no n. 201 da Exortação Christus vivit: “A Igreja é como uma canoa, na qual os idosos ajudam a manter a rota, interpretando a posição das estrelas, e os jovens remam com força, imaginando o que os espera mais além”. E como não dizer ainda muito obrigado pela gentileza com que me recebia cada vez que me hospedava no Calafate, considerando-me e fazendo-me sentir um membro da comunidade local. Sinto-me confortado por não ter deixado de expressar esses mesmos motivos de gratidão por ocasião de seu aniversário de 90 anos. Afinal, como escreveu o poeta Virgílio, “enquanto o rio correr, os montes fizerem sombra e o céu tiver estrelas, deve durar a memória do benefício recebido”. Bem, é hora de terminar. Já me excedi e sei que o senhor não apreciava textos ou discursos longos. Quis apenas renovar-lhe meu afeto, minha gratidão e minha amizade. O senhor partiu depois de ter visitado sua querida Paróquia da Asa Norte (Brasília) e de ter reencontrado amigos e amigas que lhe são muito caros. Nos poucos dias de sua internação hospitalar, não lhe faltou a diligente assistência dos Coirmãos, inclusive daquele a quem um dia o senhor recebeu junto às fontes do Batismo. Consta ainda que, pouco antes de falecer, o senhor recitou a Ave Maria, a mesma que cadenciava seu rosário de todas as manhãs. Quantas vezes o senhor terá repetido: “Rogai por nós, pecadores, agora e na hora de nossa morte...”. E a Mãe Imaculada, assim como esteve ao seu lado na peregrinação da vida, também o acompanhou na hora em que ela chegou ao fim, tonificando sua fé, acalmando sua inquietude, reavivando sua esperança, mostrando-lhe Jesus. E assim será, também para nós, quando o sol se apagar nos lampejos do crepúsculo da existência: na penumbra da noite, resplandecerá um rosto materno, cuja ternura infinita nos fará recordar aquele outro rosto que foi o primeiro a contemplar-nos entre sorrisos e lágrimas quando chegamos ao mundo. Então, a piedade da Mãe nos fará descansar na misericórdia do Eterno e nasceremos, enfim, para a Vida que não termina. Até lá, querido Pe. Luiz!
Pe. João Batista Cornagliotto, CM
Pe. João Batista Cornagliotto, CM Via sacra Nós Vos adoramos, ó Cristo, e Vos bendizemos, porque pela Vossa Santa Cruz remiste o mundo.  ORAÇÃO PREPARATÓRIA Senhor meu Jesus Cristo, vós andastes este caminho por minha causa; tomastes sobre vossos ombros o enorme madeiro da cruz e fostes expirar cravado nele para me remir; derramastes vosso sangue para lavar as minhas. iniquidades; e eu, filho ingrato, tenho-me apartado de vós correndo pelo caminho da perdição, tenho voltado as costas à cruz que me destes, não tenho aproveitado o fruto dos sacramentos que manaram de vosso divino lado; mas agora Senhor, venho a vós como ovelha perdida que busca o pastor, como filho pródigo que busca o pai amoroso, como o enfermo que busca o médico da vida. Recebei-me, Senhor, benignamente, como recebestes a Madalena penitente, ouvi-me como ouvistes o ladrão arrependido. Convosco quero caminhar até o Calvário; para que, unido convosco, viva e morra abraçado com a vossa cruz e experimente os efeitos de vossa misericórdia neste mundo e na eternidade. Amém. CANTO A morrer crucificado Teu Jesus é condenado Por teus crimes pecador. (bis)   Pecador contrito Segue teu Jesus Que por teu amor Vai morrer na Cruz. Pecador que dormes Sobre teus pecados Olha que hoje mesmo Podes ser julgado. (Bis) I. ESTAÇÃO JESUS É CONDENADO À MORTE P. Nós Vos adoramos ó Cristo e Vos bendizemos. T. Porque pela Vossa Santa Cruz remistes o mundo. Considera como o sacrílego presidente Pilatos proferiu contra o Autor da vida sentença de morte, depois de o ter mandado açoitar publicamente com tanta crueldade, que chegou três vezes às agonias da morte. Contempla o amor infinito do teu Senhor, pelo muito que padeceu para te salvar. Pede-lhe que risque a sentença de morte eterna que por tuas culpas tens merecido, e assente o teu nome no livro dos predestinados para a eterna vida. Pêsa-me, Senhor, de todo o meu coração de ter ofendido a vossa infinita bondade, proponho com vossa graça a emenda, e espero que me perdoeis por vossa infinita misericórdia. Amém. (Pai Nosso, Ave-Maria e Glória). CANTO Com a cruz é carregado. O E do pêso acabrunhado, Vai morrer por teu amor. (bis) Pecador contrito Segue teu Jesus Que por teu amor Vai morrer na Cruz. Pecador que dormes Sobre teus pecados Olha que hoje mesmo Podes ser julgado. (Bis) II. ESTAÇÃO JESUS COM A CRUZ ÀS COSTAS P. Nós Vos adoramos ó Cristo e Vos bendizemos. T. Porque pela Vossa Santa Cruz remistes o mundo. Considera como os ministros da crueldade, depois de lerem à voz de pregão a sentença de morte de nosso Redentor, tornando-lhe a vestir a túnica, que para o açoitarem lhe tinham despido, puseram sobre seus delicados ombros o pesado lenho da cruz. - Para o Calvário vai, ó alma, teu inocente Senhor cercado de algozes, cheios de opróbrios; e oprimido com o peso da cruz a dar nela a vida, crucificado por teu amor. Propõe firmemente segui-lo toda a vida, com a cruz que te der, até que chegues a morrer crucificada juntamente com ele. Pesa-me, Senhor, de todo o meu coração de ter ofendido a vossa infinita bondade, proponho com vossa graça a emenda, e espero que me perdoeis por vossa infinita misericórdia. Amém. (Pai Nosso, Ave-Maria e Glória). CANTO Com o madeiro oprimido, Cai Jesus desfalecido, Pela tua salvação (bis) Pecador contrito Segue teu Jesus Que por teu amor Vai morrer na Cruz. Pecador que dormes Sobre teus pecados Olha que hoje mesmo Podes ser julgado. (Bis) III. ESTAÇÃO JESUS CAI PRIMEIRA VEZ P. Nós Vos adoramos ó Cristo e Vos bendizemos. T. Porque pela Vossa Santa Cruz remistes o mundo. Considera como nosso Redentor, fatigado do caminho, aflito com o peso da cruz, e obrigado da fraqueza que padecia pelo muito sangue que de suas chagas tinha derramado, caiu em terra. - Contempla prostrado aos pés de seus mesmos inimigos o teu Jesus e pondera que foram as tuas soberbas que o fizeram inclinar assim até a terra. Pede-lhe, com lágrimas de verdadeira contrição te perdoe as culpas, que foram causa das suas quedas. Pesa-me, Senhor, de todo o meu coração de ter ofendido a vossa infinita bondade, proponho com vossa graça a emenda, e espero que me perdoeis por vossa infinita misericórdia. Amém. (Pai Nosso, Ave Maria e Glória) CANTO De Maria lacrimosa, No encontro lastimosa, Vê a terna compaixão. (bis) Pecador contrito Segue teu Jesus Que por teu amor Vai morrer na Cruz. Pecador que dormes Sobre teus pecados Olha que hoje mesmo Podes ser julgado. (Bis) IV. ESTAÇÃO JESUS ENCONTRA-SE COM SUA AFLITA MÃE P. Nós Vos adoramos ó Cristo e Vos bendizemos. T. Porque pela Vossa Santa Cruz remistes o mundo. Considera como os dulcíssimos corações de Jesus e Maria foram traspassados de dor no encontro da rua da Amargura. Oh! que afetos tão admiráveis teriam estes dois corações nesta ocasião? Que amores tão ardentes! E que saudações em silêncio tão dolorosas! - Ó Mãe amorosíssima de meu Deus, fui eu que com meus pecados dei causa a tantos sentimentos; bem sei que não mereço o vosso patrocínio, mas espero de vossa piedade o que desmereço por minha miséria. Pesa-me, Senhor, de todo o meu coração de ter ofendido a vossa infinita bondade, proponho com vossa graça a emenda, e espero que me perdoeis por vossa infinita misericórdia. Amém. (Pai Nosso, Ave-Maria e Glória). CANTO Em extremo desmaiado, Deve auxilio aqui, cansado, Receber de Simeão. (bis) Pecador contrito Segue teu Jesus Que por teu amor Vai morrer na Cruz. Pecador que dormes Sobre teus pecados Olha que hoje mesmo Podes ser julgado. (Bis) V. ESTAÇÃO SIMÃO CIRENEU AJUDA JESUS A LEVAR A CRUZ P. Nós Vos adoramos ó Cristo e Vos bendizemos. T. Porque pela Vossa Santa Cruz remistes o mundo. Considera como os judeus temendo que acabasse a vida antes que chegasse ao Calvário o nosso clementíssimo Jesus, obrigaram Simão Cirineu a que o ajudasse a levar a cruz com o maligno intento de o crucificarem ainda vivo. 1 Ó amorosíssimo Senhor, quem me dera se resolvessem meus olhos em lágrimas para chorar dignamente as culpas que vos ocasionaram tantas penas! e vos ajudasse eu a levar a cruz, que até agora tenho fugido. Pesa-me, Senhor, de todo o meu coração de ter ofendido a vossa infinita bondade, proponho com vossa graça a emenda, e espero que me perdoeis por vossa infinita misericórdia. Amém. (Pai Nosso, Ave-Maria e Glória). CANTO O seu rosto ensanguentado, Por Verônica enxugado, Contemplemos com amor. (bis) Pecador contrito Segue teu Jesus Que por teu amor Vai morrer na Cruz. Pecador que dormes Sobre teus pecados Olha que hoje mesmo Podes ser julgado. (Bis) VI. ESTAÇÃO A VERÔNICA ENXUGA A FACE DE JESUS P. Nós Vos adoramos ó Cristo e Vos bendizemos. T. Porque pela Vossa Santa Cruz remistes o mundo. Considera como uma devota mulher chamada Verônica, vendo o rosto sagrado de Jesus coberto de sangue, e eclipsado com as asquerosas imundícies que lhe tinham lançado os judeus, rompeu por meio deles, e o limpou com uma toalha em que o Senhor lhe deixou es- tampado o seu retrato. - Dulcíssimo Jesus, eu vos ofereço o meu coração, para que estampeis nele o retrato de vossa divina presença; e, se o têm manchado as inumeráveis culpas que cometi, peço-vos que mo aceiteis lavado em lágrimas de verdadeira contrição. Pesa-me, Senhor, de todo o meu coração de ter ofendido a vossa infinita bondade, proponho com vossa graça a emenda, e espero que me perdoeis por vossa infinita misericórdia. Amém. (Pai Nosso. Ave-Maria e Glória). CANTO Outra vez desfalecido, Pelas dores abatido, Cai por terra o Salvador. (bis) Pecador contrito Segue teu Jesus Que por teu amor Vai morrer na Cruz. Pecador que dormes Sobre teus pecados Olha que hoje mesmo Podes ser julgado. (Bis) VII. ESTAÇAO JESUS CAI SEGUNDA VEZ P. Nós Vos adoramos ó Cristo e Vos bendizemos. T. Porque pela Vossa Santa Cruz remistes o mundo. Considera como o amantíssimo Salvador, atropelado dos empuxões que lhe davam para que saísse quanto antes da cidade, caiu segunda vez em terra. - Ó pobre alma! E quantas vezes tens tu com a mesma violência lançado de teu coração pela porta da culpa a teu Deus e Senhor? Quando cometeste os pecados que outra coisa foi senão dar-lhe empurrões para que saísse mais depressa da tua alma? Prostra-te agora a seus divinos pés, pede-lhe perdão de tuas culpas e propõe nunca mais ofendê-lo. Pesa-me, Senhor, de todo o meu coração de ter ofendido a vossa infinita bondade, proponho com vossa graça e emenda, e espero que me perdoeis por vossa infinita misericórdia. Amém. (Pai Nosso. Ave-Maria e Glória). CANTO Das matronas piedosas, Filhas de Sião, chorosas, É Jesus consolador. (bis) Pecador contrito Segue teu Jesus Que por teu amor Vai morrer na Cruz. Pecador que dormes Sobre teus pecados Olha que hoje mesmo Podes ser julgado. (Bis) VIII. ESTAÇÃO JESUS PREDIZ ÀS FILHAS DE JERUSALÉM OS MALES DE SUA PÁTRIA P. Nós Vos adoramos ó Cristo e Vos bendizemos. T. Porque pela Vossa Santa Cruz remistes o mundo. Considera como nosso Redentor disse às filhas de Jerusalém que o seguiam, chorando : « Não choreis por mim, chorai por vós; não choreis as minhas penas, chorai a causa delas, que são as vossas culpas e as de vossos filhos >>. 1 O misericordiosíssimo Senhor, que a troco de que os pecadores chorem as suas culpas, não quereis que se compadeçam das vossas penas! Quem me dera se arrasassem meus olhos em lágrimas para chorar por mim e por vós! Por mim o muito que vos tenho ofendido; por vós o muito que vos vejo padecer por amor de mim. Pesa-me, Senhor, de todo o meu coração, de ter ofendido a vossa infinita bondade, proponho com vossa graça a emenda, e espero que me perdoeis por vossa infinita misericórdia. Amém. (Pai Nosso, Ave-Maria e Glória). CANTO Cai terceira vez prostrado, Pelo peso esmagado Dos pecados e da cruz. (bis) Pecador contrito Segue teu Jesus Que por teu amor Vai morrer na Cruz. Pecador que dormes Sobre teus pecados Olha que hoje mesmo Podes ser julgado. (Bis) IX. ESTAÇÃO JESUS CAI TERCEIRA VEZ P. Nós Vos adoramos ó Cristo e Vos bendizemos T. Porque pela Vossa Santa Cruz remistes o mundo. Considera como, junto do monte Calvário, caiu nosso amantíssimo Jesus terceira vez com tanta mágoa, que chegou a tocar a terra com a sua santíssima boca. O dulcíssimo Jesus, quem tivera bastantes corações, para alcatifar com eles a aspereza desse caminho, com que se fizessem as vossas quedas menos sensíveis! Mas ai de mim, que um único coração, que tenho, é mais duro que as mesmas pedras Ó alma ingrata, acaba agora de conhecer que as reincidências nas tuas culpas são quedas em teu Redentor que o obrigam a beijar a terra. Resolve-te a emendar de vida, para que lhe não repitas tantas penas. Pesa-me, Senhor, de todo o meu coração de ter ofendido a vossa infinita bondade, proponho com vossa graça a emenda, e espero que me perdoeis por vossa infinita misericórdia. Amém. (Pai Nosso, Ave-Maria e Glória). CANTO Dos vestidos despojado, Por verdugos maltratado. Eu vos vejo, meu Jesus! (bis) Pecador contrito Segue teu Jesus Que por teu amor Vai morrer na Cruz. Pecador que dormes Sobre teus pecados Olha que hoje mesmo Podes ser julgado. (Bis) X. ESTAÇÃO JESUS É DESPOJADO DE SUAS VESTES P. Nós Vos adoramos ó Cristo e Vos bendizemos. T. Porque pela Vossa Santa Cruz remistes o mundo. Considera como, depois de darem ao nosso amantíssimo Salvador o vinho misturado com fel, o despojaram com sacrílega irreverência da túnica inconsútil, que estava pegada ao chagado corpo, com que se renovaram todas as chagas e começaram de novo derramar a copioso sangue. O clementíssimo Senhor, que para me restituirdes a veste nupcial da graça, consentís que vos dispam à vista de inumerável povo, com tanta ignomínia e afronta vossa, concedei-me que se vista o meu coração de luto para chorar as minhas culpas, e nunca mais perca a graça da qual por vossa bondade me tendes revestido. Pesa-me, Senhor, de todo o meu coração de ter ofendido a vossa infinita bondade, proponho com vossa graça a emenda, e espero que me perdoeis por vossa infinita misericórdia. Amém. (Pai Nosso, Ave-Maria e Glória). CANTO Sois por mim à cruz pregado Insultado, blasfemado, Com cegueira e com furor. (bis) Pecador contrito Segue teu Jesus Que por teu amor Vai morrer na Cruz. Pecador que dormes Sobre teus pecados Olha que hoje mesmo Podes ser julgado. (Bis) XI. ESTAÇÃO JESUS É PREGADO NA CRUZ P. Nós Vos adoramos ó Cristo e Vos bendizemos. T. Porque pela Vossa Santa Cruz remistes o mundo Considera como mandaram imperiosamente aqueles algozes a nosso pacientíssimo Jesus que se estendesse sobre a cruz; e obedecendo o Senhor com prontidão, pregaram em suas mãos e pés agudos cravos com gravíssima dor; e, não satisfeitos com esta crueldade, lhe tornaram a penetrar a sagrada cabeça com as pontas da coroa de espinhos, que lhe tinham arrancado quando lhe despiram a túnica. Contempla, ó alma, como vendo-se o teu Redentor cravado na cruz, levantaria os olhos ao seu Eterno Pai, oferecendo-lhe as suas dores, para remédio de tuas culpas, entretanto que tu continuas a desprezá-lo e ofendê-lo. Pesa-me, Senhor, de todo o meu coração de ter ofendido a vossa infinita bondade, proponho com vossa graça a emenda, e espero que me perdoeis por vossa infinita misericórdia, Amém. (Pai Nosso, Ave-Maria e Glória). CANTO Por meus crimes padecestes, Meu Jesus, por mim morrestes, Oh! quão grande é minha dor. (bis) Pecador contrito Segue teu Jesus Que por teu amor Vai morrer na Cruz. Pecador que dormes Sobre teus pecados Olha que hoje mesmo Podes ser julgado. (Bis) XII ESTAÇÃO JESUS MORRE NA CRUZ P. Nós Vos adoramos ó Cristo e Vos bendizemos. T. Porque pela Vossa Santa Cruz remistes o mundo Considera como, depois de três horas de agonia sobre a cruz, exala Jesus o último suspiro, entretanto que os judeus vomitam contra Ele terríveis blasfêmias. Logo o céu se vestiu de luto, o sol se eclipsou totalmente, a lua negou suas influências, tremeu a terra, partiram-se os rochedos, abriram-se as sepulturas, rasgou-se de alto a baixo o véu do templo, confundiram-se os elementos e toda a ordem da natureza se alterou, enchendo-se o mundo todo de pavoroso assombro. O alma remida com o sangue de teu Deus, se as criaturas insensíveis se confundem e se assombram na morte do seu Criador, que esperas tu, que não choras e te arrependes depois de ter sido a causa de sua morte?! Pesa-me, Senhor, de todo o meu coração de ter ofendido a vossa infinita bondade, proponho com vossa graça e emenda, e espero que me perdoeis por vossa infinita misericórdia. Amém. (Pai Nosso, Ave-Maria e Glória). CANTO Do madeiro vos tiraram, E à mãe vos entregaram, Com que dor e compaixão. (bis) Pecador contrito Segue teu Jesus Que por teu amor Vai morrer na Cruz. Pecador que dormes Sobre teus pecados Olha que hoje mesmo Podes ser julgado. (Bis) XIII. ESTACÃO JESUS É DESCIDO DA CRUZ P. Nós Vos adoramos ó Cristo e Vos bendizemos. T. Porque pela Vossa Santa Cruz remistes o mundo. Considera como o sagrado Corpo de nosso Redentor foi despregado da cruz, e posto nos amorosos braços de sua angustiada Mãe, e Senhora nossa. - Ó minha alma, se esperas a felicidade eterna por intercessão de Maria Santíssima, imita a esta Senhora nos admiráveis afetos que nesta ocasião sentiu, vendo seu amado Filho todo desfigurado, chagado e ensanguentado, que nisto lhe fará a tua devoção fervorosa o maior obséquio. Ó Mãe amorosíssima de meu Deus, pelas dores e angústias que neste doloroso passo tivestes, vos peço me alcanceis graças para aliviar as vossas dores por meio de uma verdadeira contrição de minhas culpas. Pesa-me, Senhor, de todo o meu coração de ter ofendido a vossa infinita bondade, proponho com vossa graça a emenda, e espero que me perdoeis por vossa infinita misericórdia. Amém. (Pai Nosso, Ave-Maria e Glória). CANTO No sepulcro vos deixaram, Sepultado vos choraram, Magoado o coração. (bis) Pecador contrito Segue teu Jesus Que por teu amor Vai morrer na Cruz. Pecador que dormes Sobre teus pecados Olha que hoje mesmo Podes ser julgado. (Bis) XIV. ESTACÃO JESUS É DEPOSITADO NO SEPULCRO P. Nós Vos adoramos ó Cristo e Vos bendizemos T. Porque pela Vossa Santa Cruz remistes o mundo. Considera como o Corpo de nosso Redentor foi depositado no sepulcro por Maria Santíssima, e outros fiéis, que a acompanharam no piedoso enterro de seu divino Filho e nosso amabilíssimo Jesus. Pondera como vendo-se finalmente a saudosa Mãe no silêncio da noite, ausente de seu amado Filho, arrasados os olhos em lágrimas, cercada o coração de angústias, se deixou possuir toda da amargura de sua dor. Ó alma insensível que sem te compadeceres das dores de tua lastimada Senhora, acrescentas com tua ingratidão novos tormentos à sua soledade! Prostra-te hoje arrependida a seus pés! pede-lhe perdão de tuas culpas, para que seja tua protetora junto ao trono do seu divino Filho, e te receba em seus braços na hora da morte. Pesa-me, Senhor, de todo o meu coração de ter ofendido a vossa infinita bondade, proponho com vossa graça a emenda, e espero que me perdoeis por vossa infinita misericórdia. Amém. (Pai Nosso, Ave-Maria e Glória). CANTO Pela Virgem dolorosa, Vossa Mãe tão piedosa, Perdoai-me, meu Jesus! (bis) Pecador contrito Segue teu Jesus Que por teu amor Vai morrer na Cruz. Pecador que dormes Sobre teus pecados Olha que hoje mesmo Podes ser julgado. (Bis) ORAÇÃO FINAL À SANTÍSSIMA VIRGEM DOLOROSA Virgem Maria, Mãe de Deus, mártir de amor e de dor, vós concorrestes para o benefício da minha redenção com as angústias sem número que sofrestes ao pé da Cruz e com a oferta que fizestes ao Eterno Pai do seu e vosso Unigênito, em holocausto e vítima de propiciação por meus pecados. Eu me compadeço da acerbíssima dor que padecestes; dou vos graças pelo amor com que vos privastes de vosso amado Filho, Jesus, para que fosse salvo este pecador; interponde a Vossa intercessão, para que eu não torne a crucificar com novas culpas o amoroso Redentor, mas perseverando na sua graça até a morte, obtenha a vida eterna pelos merecimentos da sua dolorosa paixão e morte de cruz. Amém. P. Nós Vos adoramos ó Cristo e Vos bendizemos. T. Porque pela Vossa Santa Cruz remistes o mundo. OREMOS Senhor Jesus Cristo, que, na sexta hora para a redenção do mundo, subistes o patíbulo da cruz e derramastes vosso precioso sangue para a remissão dos pecados, rogamo-vos humildemente que depois de nossa morte, nos concedais, passar, cheios de alegria, as portas do Paraíso. Vós que viveis e reinais pelos séculos dos séculos. Amém. CANTO Meu Jesus, por vossos passos, Recebei-me em vossos braços A mim, pobre pecador! Pecador contrito Segue teu Jesus Que por teu amor Vai morrer na Cruz. Pecador que dormes Sobre teus pecados Olha que hoje mesmo Podes ser julgado. (Bis) CANTICOS FINAIS Senhor Deus, Misericórdia! Cantor: Senhor Deus, misericórdia! Todos: Senhor Deus, misericórdia! Cantor: Senhor Deus, pequei, Senhor, misericórdia! Todos: Senhor Deus, pequei, Senhor, misericórdia! Cantor: Senhor Deus, pelas dores de Maria Santíssima, misericórdia! Todos: Senhor Deus, pelas dores de Maria Santíssima, misericórdia! ESTAVA A MÃE DOLOROSA Estava a Mãe: dolorosa Junto ao pé da Cruz chorosa Enquanto o Filho pendia. (bis) Mãe de Jesus transpassada De dores ao pé da Cruz Rogai por nós, rogai por nós Rogai por nós a Jesus.   PERDÃO, MEU JESUS! Perdão, meu Jesus, Perdão, Deus de amor, Perdão, Deus clemente; Perdoai, Senhor! Eis-me a vossos pés, Grande pecador; Meus enormes crimes, Perdoai, Senhor. Já os meus pecados, Lamento com dor; Estou compungido Perdoai, Senhor! PEQUEI, SENHOR, MISERICÓRDIA Tem piedade, Senhor, e sê clemente, Tua bondade apague o meu pecado; E lava-me de toda a minha culpa, Purifica-me de minha iniquidade. Reconheço a minha maldade, À minha frente está sempre o meu pecado; Foi contra ti, só contra ti que eu pequei E cometi o que é mau aos teus olhos. O MEU CORAÇÃO É SÓ DE JESUS O meu coração é só de Jesus: A minha alegria é a Santa Cruz! AIV   Em todo o lugar dizer-me ouvirão: Que viva Jesus no meu coração! Em penas e dôres, em toda aflição: Que viva Jesus no meu coração! Morrendo, repito na minha oração: Que viva Jesus no meu coração! VITÓRIA! Vitória! Tu reinarás! Ó Cruz! Tu nos salvarás! Brilhando sobre o mundo Que vive sem a tua luz, Tu és um sol fecundo De amor e de paz, ó Cruz! Aumenta a confiança Do pobre e do pecador, Confirma nossa esperança Na marcha para o Senhor. ORAÇÃO PARA A VIA SACRA NA RUA OREMOS: Senhor, humildemente Vos rogamos, olhai, propício, para esta vossa família, pela qual Nosso Senhor Jesus Cristo não hesitou em se entregar às mãos dos mal feitores e sofrer o tormento da Cruz, Ele que, sendo Deus, convosco vive e reina por todos os séculos dos séculos. Amem. Faze, ó Mãe, fonte de amor, Que eu sinta de Cristo a dor, Para contigo chorar!   * Publicada no livreto  'Tesouro do Cristão', de João Batista Cornagliotto, CM  * Sobre o autor: O padre João Batista Cornagliotto, reitor do Seminário Menor de Mariana entre 1855 a 1902, constituiu fama como eminente pregador desde os tempos do Colégio da Bahia (1852), quando proferia sermões duas vezes ao dia, “a fim de que os fiéis pudessem comparecer, visto que as igrejas não comportavam a grande quantidade de ouvintes”. Em Mariana, suas homilias da Quaresma e da Paixão, pronunciadas entre os anos de 1859 a 1877, não deixaram de ser citadas pelas obras memorialistas. Durante sua carreira como reitor no Seminário de Mariana, publicou em média quatro livros de significativa expressividade e difusão, dentre os quais se encontram o Thesouro do Christão; Thesourinho do Christão; Trezentas e Sessenta e cinco Meditações; Tríplice devoção de Jesus, Maria e José e Meditações da Paixão, todos publicados sob anonimato. Sua produção discursiva foi extremamente importante para a legitimação de suas propostas concernentes ao projeto de Igreja e ao modelo de sacerdote em que o reitor objetivava formar no Seminário de Mariana durante sua vigência. O Seminário serviu como modelo e pioneiro de uma série de reformulações na formação do clero em todo o Brasil. Além disso, suas obras, e, portanto, suas propostas, foram utilizadas em vários seminários brasileiros e lidos por religiosos de vários países, sobretudo associados à Congregação da Missão. Suas obras foram identificadas nos Annales de la Congrégation de la Mission de 1903, publicados anualmente em Paris, mostrando a repercussão internacional das mesmas. Outra modalidade discursiva promovida pelo padre Cornagliotto, que será a documentação central em nossa análise, consiste nas suas correspondências, trocadas com seus companheiros de viagem ao Brasil e com seus superiores franceses. Algumas de suas cartas foram divulgadas nos Annales de la Congrégation de la Mission, publicados anualmente em Paris, relatando a situação da localidade e os feitos executados pelo missionário, dentre outros assuntos. No interior dos anais, uma seção especial é reservada à Província Brasileira, com destaque à diocese de Mariana, reunindo um conjunto de cartas referentes aos missionários presentes no bispado, dentre elas as do padre Cornagliotto. É interessante notar que tal publicação era lida por religiosos no mundo inteiro, inclusive no Brasil, servindo, portanto, para a difusão da doutrina católica e de instrumento de incentivo à fé aos leitores de suas cartas. Destarte, algumas dessas correspondências foram provavelmente selecionadas para publicação. Devido a essa seleção, nem todas as propostas e intenções do padre Cornagliotto foram divulgadas, contudo, tal circunstância não nos impede de referendarmos nossa proposta, haja vista que as poucas cartas encontradas nos dão subsídios para desenvolvermos nossa análise. Apesar das “paixões” e angústias serem reveladas no epistolário, mesmo que de maneira contida, não devemos descartar o fato de que as cartas não expressam somente a intimidade do autor, mas sim a relação estabelecida entre o remetente e seu destinatário. Desse modo, o uso de alegorias não foi descartado, visto que ambos os envolvidos (remetente e destinatário) eram religiosos e compartilhavam de instrumentos retóricos e concepções de mundo similares. O projeto de igreja e de formação do clero presentes no discurso do padre Cornagliotto, ainda que vinculados ao processo de romanização empreendido na diocese de Mariana, não deixaram de comportar suas especificidades, além de terem sido compartilhados em âmbito nacional, sobretudo devido a grande circularidade de suas obras e cartas. Portanto, o estudo da escrita do padre João Batista Cornagliotto elucida uma reelaboração discursiva que foi essencial à Igreja Católica brasileira no século XIX, na medida em que se constituiu como ferramenta importante na resposta às afrontas racionalistas e na permanência do cristianismo na cultura moderna.  
Pe. Allan Júnio Ferreira, CM
Pe. Allan Júnio Ferreira, CM Ano Vocacional 2023 A Igreja no Brasil iniciou, dia 20 de novembro de 2022, na solenidade de Cristo Rei do Universo, seu terceiro Ano Vocacional, de acordo com proposta da Conferência dos Bispos do Brasil (CNBB). O objetivo da iniciativa está em despertar a corresponsabilidade entre os fiéis, não somente quanto às vocações ministeriais, mas também com relação às vocações cristãs. O primeiro ano vocacional aconteceu em 1983, quase 40 anos atrás, e teve como tema e lema “Vem e segue-me” (Mt 19,21; Mc 10,21; Lc 18,22). De lá para cá, aconteceram muitas iniciativas, tais como: congressos e meses vocacionais, que trabalharam a temática vocacional nas paróquias e comunidades e ainda produziram os primeiros subsídios vocacionais. Em 2003, aconteceu o segundo ano vocacional, com o tema “Batismo, fonte de todas as vocações” e o lema “Avancem para águas mais profundas” (Lc 5,4). Agora nos preparamos para a vivência do terceiro Ano Vocacional, que se iniciou no dia 20/11/22 e vai até o dia 26/11/2023. Todas as comunidades são chamadas a colocar os pés a caminho, numa atitude de missão e comunhão com o Mestre que chama. O tema escolhido para este Ano Vocacional é: “Vocação: Graça e Missão” e lema: “Corações ardentes, pés a caminho” (Lc 24, 32-33). Refletir sobre vocação, que significa chamamento, é trazer à luz a nossa própria experiência enquanto pessoas e como batizados. O nosso primeiro chamado é a vida, no sentido mais profundo. Aquela vida que Jesus promete a cada um de nós. “Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida” ( Jo 14, 6) e ainda: “Eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância” (Jo 10, 10). Não é qualquer vida, mas a vida toda do ser humano, em sua integralidade. Enquanto batizados, somos chamados à Missão, a assumirmos a vida do Mestre Jesus, que não fez outra coisa senão “evangelizar os pobres” (Lc 4, 18). Em sua vida, doada ao Reino de Deus, Jesus se colocava em estado permanente de missão, anunciando a Boa Nova a todos os cantos, sobretudo aos mais pobres (Mc 1, 14-15). O lema do Ano Vocacional faz referência ao episódio dos discípulos de Emaús (Lc 24, 13-33), que de uma experiência traumática e dolorosa, com a morte do Mestre, passam para a alegria e o anúncio do Ressuscitado. Se outrora o olhar dos discípulos que caminhavam de volta para suas casas, provavelmente com o intuito de retomarem as suas vidas antes do seguimento a Jesus, se esse olhar estava desesperançoso, com a presença do caminhante e as palavras que saíam da sua boca, fizeram com que o ânimo retornasse e o coração ardesse e pulsasse novamente no compasso do coração do Mestre. Vivenciando o terceiro Ano Vocacional voltamos o nosso olhar para a nossa vocação vicentina. São Vicente de Paulo foi chamado por Deus para assumir uma missão. O santo da caridade não fechou os ouvidos à voz que o chamava e foi capaz de transformar a realidade sofrida do seu tempo, sempre em espírito de colaboração e escuta dos sinais dos tempos. Ele, que iniciou a sua trajetória vocacional com motivações que podemos julgar inconsistentes, queria ajudar a família, mas se abriu à graça de Deus e deixou-se tocar pela realidade dos mais pobres e sofredores. O seu caminho vocacional também conheceu crises. Certa vez, sentiu-se tentado contra a sua fé e tantas outras situações de dificuldades em sua missão, mas ressignificou as crises e tornou-se o gigante da caridade, o pai dos pobres e pequenos. Nós também somos convidados a reavivar o dom da nossa vocação vicentina promovendo uma verdadeira cultura vocacional e revitalizando o nosso carisma de serviço aos pobres. “Eis em que nos ocupam as regras: em ajudar os pobres, nossos mestres e senhores” SV XII, 5. Não percamos de vista o nosso chamado de sermos servidores dos pobres, pessoas vocacionadas à caridade, como São Vicente de Paulo, e desejosas de criar uma grande rede de caridade a exemplo de Frederico Ozanam. A vocação de cada um de nós faz com que o Reino de Deus aconteça no aqui e agora. E esse Reino tem lugar privilegiado aos pobres. *Artigo originalmente publicado no Informativo São Vicente Volume LVI, Número 321, referente aos meses de outubro, novembro, dezembro de 2022
Pe. Cléber Fábio Teodósio
Pe. Cléber Fábio Teodósio Consagração da Congregação da Missão à Imaculada Em 27 de julho de 1661, mesmo ano de sua eleição como Superior Geral e primeiro sucessor de São Vicente de Paulo, o Padre Renato Almerás, CM (1661-1672), publicou uma circular com o Ato de Consagração da Congregação da Missão à Virgem. Desde então, todo dia 15 de agosto, na solenidade da Assunção da Virgem Maria, o ato de consagração, que agora compartilhamos, começou a ser rezado nas comunidades da Congregação da Missão:  “Nós, indignos padres, clérigos e irmãos da Congregação da Missão, conhecendo, ó santíssima, ó gloriosa Virgem Maria, a vossa força diante de Nosso Senhor, vosso Filho, e vossa incomparável bondade para com os homens, para obter suas graças, voltamo-nos para vós como Mãe de Misericórdia. Por isso, ó Virgem Misericordiosa, prostrados, de corpo e espírito, aos pés de Vossa Majestade, rogamos-lhe, muito humildemente, que aceite a oblação comum, cordial e irrevogável de nossas almas e de nossas pessoas, que dedicamos e consagramos neste dia solene ao vosso serviço e amor, por todo o curso de nossas vidas e por toda a eternidade, propondo-nos, com a ajuda do Espírito Santo, prestar-lhe para sempre, um respeito singular e uma particular veneração, para publicar vosso nome em todo o mundo, anunciando as maravilhas do vosso poder e da vossa bondade e convidando todos os homens a honrar-vos, servir-vos, imitar-vos e invocar-vos para encontrar graça diante de Deus”. Quase um século depois, o padre Jean-Baptiste Etienne, CM, (1843-1874) pediu que a mesma consagração fosse repetida no dia 8 de dezembro, por ocasião da solenidade da Imaculada Conceição.   ***   Circular de R. P. Almeras com alterações em p. 527-529, de 27/07/1962: Irmãos, reunidos na presença do Senhor, movidos por singular veneração pelo inefável privilégio da Imaculada Conceição da Virgem Maria, e com o mais vivo apreço pelos inumeráveis com quem distinguiu a nossa pequena Companhia, renovamos a nossa consagração, dizendo: Mãe da Companhia, nós somos vossos e vossos são os nossos trabalhos! Esta pequena Companhia pertence inteiramente a você, Santa Mãe de Jesus. Desde o berço vos foi consagrada, e à sombra da vossa materna e poderosa proteção cresceu na Igreja de Deus buscando a salvação de uma multidão de homens, que bendizem e abençoarão para sempre o vosso divino Filho na mansão do eleger. Mãe da Companhia, nós somos vossos e vossos são os nossos trabalhos! Pertence a você, que cuidou desse grão de mostarda depositado na terra por Vicente de Paulo, sob seus auspícios favoráveis. Regadas pelas bênçãos do céu, derramadas por tuas mãos misericordiosas, elas se desenvolveram e se tornaram uma grande árvore que estende até longe seus ramos carregados de frutos de salvação. Mãe da Companhia, nós somos vossos e vossos são os nossos trabalhos! Todos os anos, desde a aurora do belo dia da tua Imaculada Conceição, reunidos com amor ao pé do teu altar, sentimo-nos felizes por repetir as súplicas que os nossos predecessores constantemente te dirigiram, para renovar com toda a nossa vontade a comum, sincera e irrevogável oblação que eles fizeram por nós, e para nos consagrar solenemente ao seu serviço e amor, pelo tempo de nossas vidas e por toda a eternidade. Mãe da Companhia, nós somos vossos e vossos são os nossos trabalhos! Ó bondosa e singular protetora, quantas graças e favores a vossa ternura e amor derramaram sobre esta família! Nossa pequena Companhia perecia e Você a fez reviver. Ela havia desaparecido em meio aos desastres da mais terrível das revoluções, e você a fez reaparecer marcada com o signo de sua predileção. Seus membros lamentaram seus infortúnios no exílio. Tu os reuniste para que com suas mãos exaustas levantassem de novo a casa paterna, e vislumbrassem, quando morressem, a nova glória que iria cercá-la. Ficaram muito felizes ao saber, por meio de uma palavra misteriosa, que "Deus se serviria da família de São Vicente para reavivar a Fé". Mãe da Companhia, nós somos vossos e vossos são os nossos trabalhos! A escassa Companhia se expandiu e pôde dizer em seu coração: “Quem me gerou todos estes filhos? Eu, que era estéril e abandonada há pouco tempo, como de repente me tornei tão fértil (Is 49,22). Miríades de homens apostólicos que saíram de seu ventre, dispersaram-se até os confins do mundo. Ásia, África, América, tornaram-se, como a Europa, o campo de seu trabalho. O árabe, o etíope, o grego, o herege e o infiel já bebiam das mesmas fontes de salvação que o levita e o camponês. Mãe da Companhia, nós somos vossos e vossos são os nossos trabalhos! Um novo privilégio veio para aumentar essa alegria e prosperidade. A Sociedade foi concedida não só para ser portadora da chama do amor em todo o universo, mas também para testemunhá-la através do martírio. Mãe da Companhia, nós somos vossos e vossos são os nossos trabalhos! Tantos favores, ó nossa terna Mãe, sabemos que foram efeitos da tua bondade. Temos o prazer de contemplá-lo nos esplendores do céu, derramando sobre nós o tesouro de graças do qual você é o dispensador. Lembre-se de que você é nossa Rainha e Senhora e que somos consagrados a você sem reservas. Mãe da Companhia, nós somos vossos e vossos são os nossos trabalhos! Intercede por nós, poderosa Medianeira, para que obtenhamos a graça de amar mais ou mais o teu divino Filho, e de nos dedicarmos inteiramente ao engrandecimento do seu reino. Mãe da Companhia, nós somos vossos e vossos são os nossos trabalhos! Pede que sejamos cheios do espírito do nosso Fundador, que pratiquemos fielmente as virtudes da simplicidade, humildade, mansidão, mortificação e zelo pela salvação das almas. Mãe da Empresa, nós somos vossos e vossos são os nossos trabalhos! Grave profundamente em nossos corações o amor à castidade, à pobreza, à obediência e às nossas santas Regras. Mãe da Companhia, nós somos vossos e vossos são os nossos trabalhos! Alcançai-nos para que vivamos em santa união e com grande fervor, para que todos nos tornemos, cada um no seu ministério, verdadeiros apóstolos de Jesus Cristo e zelosos imitadores das vossas virtudes. Mãe da Companhia, nós somos vossos e vossos são os nossos trabalhos! Ó Maria, concebida sem pecado, rogai por nós que recorremos a Vós. Decreto da Assembleia de 1843
Pryscylla Cordeiro Rodrigues Santirocchi
Pryscylla Cordeiro Rodrigues Santirocchi A Congregação da Missão no Ceará Oitocentista Durante a segunda metade do século XIX, os padres lazaristas, pertencentes à Congregação da Missão, deixaram a Europa para dispersar-se pelo mundo, esta foi uma das congregações religiosas que mais contribuíram para a mundialização do catolicismo. Nessa época, várias regiões brasileiras receberam esses religiosos, que trouxeram ao país a sua cultura congregacional, atuando em seminários, colégios, hospitais, asilos e realizando missões populares. A província do Ceará foi um dos locais no qual essa instituição se instalou em 1864, após dois anos de negociações entre o bispo D. Luís Antônio dos Santos e o Superior Geral Jean-Baptiste Étienne. A Congregação da Missão desempenhou um papel fundamental para a reforma da Igreja cearense, pois atuou no seminário Episcopal do Ceará (Seminário da Prainha) e realizou missões para as populações pobres dos sertões. O primeiro reitor do Seminário da Prainha, foi o padre Pierre-Auguste Chevalier (1831-1901), que esteve a frente daquela instituição por 27 anos. Nesse período, o corpo docente do seminário foi composto por diversos lazaristas vindos da Europa, de outras regiões do Brasil e por ex-alunos do seminário. Cerca de 250 estudantes do norte e do nordeste estudaram no Seminário da Prainha. Ao analisar as Regras do Seminário da Prainha e o Livro do Conselho do Seminário (1864-1870), percebi que os principais pontos de investimento para a formação do clero cearense foram: realização de retiros espirituais, celibato, festas religiosas, uso da batina, incentivo aos sacramentos, obediência hierárquica, vida santa, abandono das funções civis e políticas. Os seminaristas que desobedecessem o regulamento eram passíveis de punição ou até expulsão [1]. As missões lazaristas, por sua vez, foram iniciadas no Ceará em 1870. Os missionários que atuaram nelas foram os padres Guillaume Van de Sandt, José Sena de Freitas e Antoine Azémar. Eles percorreram aquela província de norte a sul, ao longo de sete anos de missões. Necessitaram adaptar-se aos costumes, clima, à língua, à geografia, à alimentação, etc. Realizaram não só pregações e sacramentos, mas também obras sociais, como a construção de poços artesianos, cemitérios e casas. As ações missionárias lazaristas foram fundamentais para o fortalecimento do catolicismo entre as populações do interior cearense e no auxílio material que necessitavam. As missões eram iniciadas sempre com os sermões e ocorriam da seguinte forma: pela manhã, pregavam “sobre os mandamentos de Deus e da Igreja e sobre os sacramentos; à noite, sobre as verdades eternas”. Assim, os sermões matinais eram mais “leves” e tinha a intenção catequizar aquelas pessoas, por conta da necessidade de instrução do povo sobre itens básicos dessa religião [2]. Em 1871, ergueram “um galpão colocado em frente à capela da aldeia” [...] abriram “um cemitério de 40 metros de comprimento, com mais de vinte de largura, que deixamos terminado” [3]. Na aldeia de Mecejana, cavaram “um poço de oito metros”, para aplacar a sede da população, com mais de 30 pessoas trabalhando, inclusive “as figuras mais proeminentes do lugar” [4]. Assim, a intenção desse texto foi a de apresentar e divulgar de forma breve, alguns resultados das pesquisas que realizei na graduação e no mestrado em História, sobre a Congregação da Missão e sua presença no Ceará Oitocentista. Atualmente, no doutorado em História, na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), busco pensar o processo de expansão da Congregação da Missão no Brasil, a partir dos diálogos entre a Casa Mãe em Paris e os missionários que atuaram nas províncias de Minas Gerais, Bahia e Ceará, durante o superiorato do padre Jean-Baptiste Étienne (1843-1874). Notas [1] Álbum Histórico do Seminário Episcopal do Ceará (1914) - Biblioteca Pública Meneses Pimentel (BPMP). Fortaleza, CE. Livro do Conselho do Seminário da Prainha (1864-1870) - Centro de Psicologia da Religião (CPR-Juazeiro do NorteCE)   [2] Annales de la Congregation de la Mission, v. 37, 1872, p. 500. Disponível em: https://via.library.depaul.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=1070&context=annales. Acesso em: 07/09/2022   [3] Annales de la Congregation de la Mission, v. 37, 1872, p. 507 e 508. Disponível em: https://via.library.depaul.edu/cgi/ viewcontent.cgi?article=1070&context=annales. Acesso em: 07/09/2022   [4] Annales de la Congregation de la Mission, v. 37, 1872, p. 514. Disponível em: https://via.library.depaul.edu/cgi/viewcontent.cgi?article=1070&context=annales. Acesso em: 07/09/2022 Sobre a autora Pryscylla Cordeiro Rodrigues Santirocchi é doutoranda em História, pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).  
Pe. Erik de Carvalho Gonçalves, CM
Pe. Erik de Carvalho Gonçalves, CM 31 de outubro, um dia abençoado... Este é um dia de algumas comemorações, embora apenas uma seja a mais conhecida, seja pelos filmes, seja também pela quantidade de festas celebradas a partir desse tema, o halloween, ou, o dia das bruxas, mais comum a nós. Para nós brasileiros, o dia 31 é o dia do Saci Pererê, em contraposição ao importado dia das bruxas, personagem folclórico que tem origem no sul do país entre os índios guarani. Popularizado principalmente por Monteiro Lobato na obra Sítio do pica-pau-amarelo, o Saci era um menino preto de uma perna só, com um gorro vermelho e um cachimbo, notório por suas travessuras e por proteger a floresta. Contudo, o presente texto quer apresentar uma marca ainda mais significativa deste dia para nós cristãos. Este é o Dia Nacional da Proclamação do Evangelho, desde 2016, instituído pela Lei 13.246/16. A partir da nossa fé, cremos que todas as coisas servem a Deus, assim, proponho uma leitura de fé das outras comemorações mencionadas acima, como forma, em última instância, de serviço Àquele que conduz todas as coisas. Se, de algum modo, o dia 31 de outubro nos remete à feitiçaria, é importante entender que o mundo da feitiçaria, é o mundo onde as palavras tem poder de fazer acontecer o que elas significam, segundo Rubem Alves, em seu livro Lições de Feitiçaria (2003). Vejamos se na nossa fé também não é assim: “No princípio, Deus criou o céu e a terra. Deus disse: “Haja luz!”, e houve luz” (Gn 1,1;3); e ainda, o Evangelho nos ensina que “tudo foi feito por meio da Palavra, e sem ela nada foi feito de tudo o que foi feito” (Jo 1,3) e “a Palavra se fez carne e veio morar entre nós” (Jo 1,14). Jesus Cristo é a Palavra de Deus e por ele, nós podemos contemplar a Glória do nosso Deus, cheio de graça e de verdade. O Papa Bento XVI, na Exortação Apostólica pós Sinodal Verbum Domini, nos recorda que “a Palavra do Senhor permanece eternamente” e “esta é a Palavra do Evangelho que vos foi anunciada” (1Pd 1,25). Então, conseguimos entender como a Palavra tem poder no meio de nós e qual o tamanho da nossa responsabilidade com o que falamos, pois, para nós que temos fé, “toda palavra deve ser boa, capaz de fazer bem a quem as ouve” (Ef 4,29). No mesmo dia 31, ao ser comemorado o Saci Pererê, recordamos as travessuras e as alegrias da nossa “meninice”. Proponho uma leitura de fé a partir da Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, do Papa Francisco, com o tema da alegria como marca essencial do anúncio do Evangelho. A Palavra de Deus nos enche de alegria quando, verdadeiramente, a escutamos, porque nos recria e nos salva, nos encaminhando para um outro modo de vida, a vida no Espírito. Olhemos como Maria se modifica inteiramente após a Palavra dita pelo anjo Gabriel: “Alegra-te, cheia de Graça! O Senhor está contigo” (Lc 1,28). Ou ainda, como a alegria de Maria é transmitida pela sua boca ao saudar Isabel, que ao escutá-la, até mesmo o menino, ainda no ventre de sua mãe, saltou de alegria (Lc 1,41). E, para os nossos dias, marcado pela angústia, insegurança e violência, como é significativo escutar da boca de Jesus Ressuscitado “vós ficareis tristes, mas a vossa tristeza se transformará em alegria”. E Jesus, comparando as nossas tristezas com as dores que mulher sente no parto, diz que, do mesmo modo, “agora nós sentimos tristeza, mas Ele nos verá de novo, e o nosso coração se alegrará, e ninguém poderá tirar a nossa alegria” (Jo 16,21-22). Contemplemos esse trecho da Palavra e nos deixemos envolver pela alegria do Evangelho proclamado pela boca de Jesus, alegria que vem acompanhada de esperança com a força de Salvação (Rm 8,24). Neste dia 31, por fim, depois das fortes emoções que vivemos, nos empenhemos em curar as feridas uns dos outros deixando sair de nossa boca o Evangelho capaz de tudo transformar, com a alegria e a força que nos vem pelo Anúncio da Palavra. Honremos este dia ensinando as pessoas a observarem tudo o que Jesus nos ensinou, pois Ele está no meio de nós até o fim dos tempos (Mt 28,20).   31 de outubro de 2022, Dia Nacional da Proclamação do Evangelho.  
Últimas Notícias